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Xico Sá

Modos de macho, modinhas de fêmea & outros chabadabadás

Perfil Xico Sá é escritor, jornalista e colunista da Folha

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Desafio às palavras cruzadas do amor

Por xicosa
19/11/12 16:10

O casal entra no Fuad, bom e popularíssimo bar-restaurante madrugador de Santa Cecília, SP.

Pede uma cerveja.

Ela, uma loira ali na faixa dos 60, saca da bolsa um Coquetel, da linha mais
difícil –Desafio- em matéria de palavras cruzadas.

Ele, na mesma faixa de idade, porém mais danificado pelo trabalho e os dias, pega a caneta e começa a preencher os quadradrinhos.

O casal se diverte. Mais uma cerva. Comida farta. Um casal que, ao melhor modo jurubeba-style de ser, encara uma maminha completa na madruga. Palmas.

É silenciando que se entendem.

Mal conversam, transformam um possível tédio amoroso em melodia, como na lírica roqueira do Cazuza.

Apenas balbuciam. Tocam de ouvido. Parecem juntos há décadas.

Quando completam a página se cumprimentam como os jovens. Yes. Mãos abertas se tocam no ar. No suspense de um achado difícil, se abraçam.

Ela está pintada como se fosse para uma festa. Ele também mantém a decência. O garçom diz que são velhos frequentadores e capricham nas vestes a qualquer dia e hora. É um gosto pela arrumação mesmo.

Sinônimo de “Fofo”, cinco letras, a segunda é “A”…

O casal prossegue.

O amor simples, desindexado de chatices e discussões, o amor muitas vezes carece apenas de uma cerveja na esquina e um coquetel de palavras cruzadas.
Sem essa de se entregar ao processo de pijamização.

Ao passeio. O passeio salva de qualquer tédio.

Não é à toa que o professor Stephen Jones, da University College de Londres (UCL), disse recentemente à BBC: a bicicleta é a invenção mais importante para o sexo e para o amor (não simplesmente por ser algo saudável e esportivo) dos últimos 100 anos.

Invenção mais relevante, para os costumes amorosos, do que a pílula anticoncepcional, a camisinha e o Viagra.

O passeio, não apenas para os pombinhos, mas para os solteiros.

“A bicicleta fez com que os homens não se limitassem mais a encontrar sua companheira sexual na porta ao lado, mas, sim, transportar-se a aldeias vizinhas e manter relações sexuais com uma mulher de outro povoado”, disse o professor londrino.

O homem sabe das coisas. A pé, como o casal do Fuad, de cavalo branco, bicicleta ou de charrete, leve o seu desejo para tomar um vento.

O pijama está para o amor como o paletó de madeira está para a vida.

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Tinha cá pra mim que agora sim...

Por xicosa
16/11/12 21:34

A mesma história, o mesmo banco, o mesmo jardim. Replay de crônica a pedidos:

“Tinha cá pra mim que agora sim, eu vivia enfim o grande amor, mentira!”

Encontro minha amiga A., no nosso botequim predileto, e a desalmada vai logo anunciando, com a ironia fina que a acompanha na riqueza e na pobreza, na saúde e na doença.

Sempre tem boas histórias e uma mania louca de escolher uma música, normalmente Chico Buarque, para trilha das sagas românticas e pés na bunda.

Como Chico tem um vasto elenco de personagens femininos e incorpora as dores e delícias das mulheres, ela escolhe no capricho, no ponto. Moleza, garoto, tira onda.

“Tinha cá pra mim que agora sim, eu vivia enfim o grande amor, mentira!”, ela repete e repete, enche o saco com o “Samba do grande amor”.

Essa música nem é protagonizada por uma fêmea, e sim por um homem desiludido do amor, um cara cujo destino parafusou-lhe na testa belos objetos pontiagudos, como diria o compay Marçal Aquino.

Mas ela insiste e canta assim mesmo. Pior: canta e ri, uma loucura. Que diabo de sofrimento é esse com essas gargalhadas todas?

A moça é assim mesmo. Não tem jeito. E olhe que nem pediu caipiroscas de frutas vermelhas nesse dia, ficou apenas no chope, coisa fina e civilizada.

“Me acabar dessa vez é que não vou”, tagarela lindamente. “Ih, estou escaldada, velho Francisco, ano passado eu morri mas esse ano eu não morro”, agora manda um Belchior de prima.

O que A. me contou uma das coisas banais que mais escuto das minhas amigas nos últimos tempos. E olhe que sou conselheiro, ombudsman das moças, cupido e ouvidor-geral de muitas crias das nossas costelas.

“Sua carteira de desesperadas é grande”, ela mesma tira uma boa loa sobre um ofício que desenvolvo com gosto e curiosidade desde os verdes anos –quando sequer eu sabia o era uma mulher para valer, conhecia apenas as cabritas e as bananeiras.

A amiga deparou-se com mais um desses homens que prometem, ensaiam, jogam um charme, cultivam, cantam de galo… comparecem e…, sem dizer nada, tomam o clássico chá de sumiço, saem para comprar o king size, sem filtro, do abandono.

“Por essas e por outras é que agora prefiro um bom canalha a um homem frouxo”, prega a amiga, conquistando rapidinho o apoio da távola redonda das gazelas ao lado. “Um canalha pelo menos me pega com gosto, como se fosse mesmo a última noite”.

Defende a tese e emenda, riso desavergonhado: “Passava um verão a água e pão, dava o meu quinhão pro grande amor, mentira!”

É rapazes, é tempo de homem frouxo, que corre mesmo diante da possibilidade de uma história mais densa e afetiva.

Não sabem o que estão perdendo. A começar pela minha amiga cantante, belo exemplar da raça, no auge dos seus 3 ponto 5, boa conversa, boa lábia, gostosa, bocão-Jolie e um humor capaz de tornar o mais nublado dos dias na mais promissora e comovente folhinha do calendário.

Sorte desse homem que encará-la com pegada e gosto!

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O homem casado, a amante e os feriadões

Por xicosa
14/11/12 20:16

Sempre um drama: vem mais um feriadão e o amante fixo –na prática um namorado!-continua casado.

Ele segue apenas na promessa. Vem sempre com aquele papo que a vida no lar doce lar está um inferno, que não aguenta mais, que é só questão de tempo, que é por causa do filhote, que dorme em quartos separados e outros tantos blablablás.

Pode ser até um pouco verdade. Não se duvida de um todo. A questão não é essa. A merda é que chegou mais um feriadão e o cara –esse cara não sou eu nem o amigo Roberto- vai à praia ou ao interior com a família.

O jeito é você torcer para chegar logo o próximo dia útil e reencontrá-lo na repartição ou na firma.Tem mulher que não suporta muito tempo essa história –no máximo uns três feriadões e olhe lá- e pula fora, sarta de banda.

Diante do grito de alerta da moça, que não é nada besta, se o homem casado tiver gamado mesmo, gamadíssimo, ele até dá um truque, um jeito, inventa a maior mentira desde o nascimento de Pinóquio, e escapole da legítima esposa.

É raro, mas acontece. Normalmente o animal acasalado gasta as mentiras no varejo da rotina. Inclusive para garantir as escapadas com a amante. Chega no feriadão e o cara já está comprometido com a família, cachorro e papagaio, não tem saída.

Você sabe como homem demora a resolver essas paradas. Se ninguém dá o grito de alerta, segue a vida, porta sempre entreaberta, como na música do Gonzaguinha. Ele segue a vida como dantes, com aquela cara de agoniado e coitadinho, mas sem mexer uma palha na história.

Nas festas de final de ano, então, esquece. No máximo um telefonema da praia, escondido no banheiro. No máximo. O comum é que não havia sinal onde ele estava.

Tudo bem que as companhias telefônicas são umas pragas, mas a tomar pelos homens casados que têm amantes o celular nem foi inventado ainda.

E assim caminha a humanidade até o próximo feriadão de novo.

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Aquele velho papo de "a gente se vê"

Por xicosa
13/11/12 16:37

“Toda mulher, após trinta dias de felicidade sente fome e sede de desgraça. Só não irá embora se não tiver condução.”

O cronista Antônio Maria, nobre autor de “Ninguém me ama, ninguém me quer”, era, como todo passional, hiperbólico, exagerado.

Mas não estava lá de todo errado ao pronunciar a sentença. De lá para cá –escreveu nos anos 60- a coisa só piorou. Vejamos.

Em uma megalópole como São Paulo e outras tantas grandes cidades brasileiras, haja encontros e desencontros, alguns não tão graves, acontece, outros infinitamente dolorosos, que nos perturbam os sentidos, que fazem a gente maldizer os céus, os astros, o destino.

Fica tudo na base do “a gente se vê”… E adeus!

Não que fosse acontecer um casamento ou algo do gênero a partir daquele encontro, nada disso, mas foram encontros bonitos, fortes, que se acabam ali mesmo, na poeira da estrada, numa tarde fria, em um café da manhã, numa simples despedida.

“A gente se vê.” Pronto, eis a senha para o terror, o “never more”, o nunca mais do corvo do Edgar A. Poe.

A gente se vê. Corta para uma multidão no viaduto do Chá.
A gente se vê. Corta para uma saída de estádio lotado em dia de decisão do campeonato.

A gente se vê. Corta para “onde está Wally”.

Nada mais detestável de ouvir do que essa maldita frase. Logo depois a porta bate e nem por milagre.

Jovens mancebos, evitem essa sentença mais sem graça. Raparigas em flor, esqueçam, esqueçam.

Melhor dizer logo que vai comprar cigarro, o velho king size filtro do abandono. Melhor dizer que vai pra nunca mais. Melhor o silêncio, o telefone na caixa postal, o telefone desligado, o desprezo propriamente dito, o desprezo on the rock´s.

A gente se vê uma ova. Seja homem, troque de palavras, use o código do bom-tom e da decência. A gente se vê é a mãe, ora, ora.

Como canta o Rei, use a inteligência uma vez só, quantos idiotas vivem só…
Esse “a gente se vê” deveria ser proibido por lei. Constar nos artigos constitucionais, ser crime inafiançável no Código Penal.

A gente se vê é pior do que a gente se esbarra por ai. Pior do que deixar ao acaso, que jamais abolirá a saudade, que vira uma questão de azar e sorte.
Melhor dizer logo “foi bom, meu bem, mas não te quero mais”. YO NO TE QUIERO MAS, como na camiseta mexicana que ganhei da Rita.

Dizer foi bom meu bem e pronto, ficamos por aqui, assim é a vida, sempre mais para curta do que longa-metragem.

A gente se vê é a bobeira-mor dos tempos do amor líquido e do sexo sem compromisso. A gente se vê é a vovozinha, ora!
Seja homem, seja mulher, diga na lata.

Não engane a moça, que a moça é fino trato, que não merece desdém ou quém quém de pato bossanovístico.

A fila anda, jogue limpo, sem essa de beque da roça para cima do futebol arte da moça.

A gente se vê. Corta para uma multidão no show do Morumbi. A gente se vê. A gente se vê. Corta para a multidão no Campo de Marte. A gente se vê. Corta para o formigueiro da Central do Brasil.

A gente se vê. Corta para a São João com a Ipiranga. A gente se vê. Corta para um engarrafamento gigante na marginal do Tietê.

A gente se vê. Corta para a Praça Castro Alves no encontro de trios elétricos. A gente se vê. Corta para o carnaval do Galo da Madrugada. A gente se vê. Então aproveita e vai olhar se eu estou na esquina!

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Do tipo que ainda leva flores

Por xicosa
11/11/12 21:26

Se está amando, leve flores no domingo.

Se ainda está em dúvida, leve flores no almoço de segunda.

Se cometeu algum deslize, leve flores na véspera. É possível levar flores preventivas.

Se procura algo que não sabe direito se existe, leve as flores partidas, como o Bill Murray, aí na foto com a trilha fodástica do filme.

Se bateu a ressaca moral infinita, flores são arranjos de desculpas e o perdão brota até nos jardins suspensos de São Paulo, caro Criolo.

Se ela(e) não quer ver a tua cara nem repaginado pelo photoshop…, lírios em domícilio, cartãozinho de próprio punho, foi mal etc, batuque um samba de regeneração no juízo da moça, aja, meu rapaz, faça alguma coisa para reparar o malfeito.

Se ela acabou, pé na bunda, as flores do jardim da nossa casa, tudo morreu pra mim, aquele papo do Roberto, chororô, saca? Ataque de Titãs: as flores de plástico não morrem jamais, mande um buquê bem vagabundo.

Se ela gosta de tirar uma onda meio cafuçu de beira de estrada, leve uma flor-calcinha, aquela rosa vendida nos postos de gasolina para os amigos caminhoneiros. Aquela rosa que vira lingerie, desconstruindo a lógica de que uma rosa é uma rosa é uma rosa, amém dona Gertrude.

Se ela finge de antirromântica, se ela odeia a Florbela Espanca, se ela não curte o spleen de Paris, se ela teima em ser chata na matéria amorosa, se ela não curte nem as flores do mal do velho Charles das antigas, nossa!, que mulher difícil, que lindo, mande-lhe os girassóis da Rússia com chão e tudo, como um tapete de grama.

Se ela é alérgica, paciência, encha o saco dos holandeses de Holambra, pergunte ao amigo Eudoro lá na serra de Maranguape, encha o saco dos competentes engenheiros da Embrapa, encha o saco de Deus, mas, pelamô, desenvolva para a menina uma flor.

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Os 10 livros mais bêbados do mundo

Por xicosa
10/11/12 18:58

Abro o jornal –sim, ainda sou um gutenberguiano viciado em cheiro de tinta- e dou de cara com o Jaguar, o homem, o mito, o gênio, o traço, alambique, o soluço, a lenda viva, viva!

O homem que criou o Pasquim, com outros caras do ramo como o Tarso de Castro, sacaneia a desgraça, assim é que se faz:

“Fui corneado por meu fígado”, disse ao Marco Aurélico Canônico. Leia aqui na Ilustrada.

É que descobriu, aos 80, o diabo de uma cirrose. A maldita. A que lá levou muitos, como o samurai-polaco Paulo Leminski e uma legião de anônimos igualmente amigos da vodka.

Jaguar parou, mas não condena. Moralismo aqui não é a tônica.

Testemunhei bons bebedores por ai. Anônimos e conhecidos como o cubano Pedro Juan Gutierrez (Trilogia Suja de Havana etc).

Quem mais me assombrou, no bom sentido, foi o Jaguar. Já na casa dos 70 anos, bateu a mim, debutando nos 40, e Ronaldo Bressane com seus 30 e um chorinho. E o mais incrível: o jovem Bruno Torturra na flor dos 20 e poucos. O embate foi na Mercearia São Pedro.

É óbvio que o álcool faz mal sim, mas como obra milagres para a gente suportar a existência. Que belo lubrificante d´almas & caveiras, diz um amigo mexicano.

Como jornalismo e literatura, tradicionalmente, sempre gastaram os cotovelos na fórmica dos balcões dos bares, deixamos ai uma lista de 10 livros que tratam do assunto. Lembre-se, porém, meu jovem: Bukowski era um bêbado, mas nem todo bêbado é Bukowski.

Memórias Alcóolicas – de Jack London (várias editoras). Tenho uma edição rara da Paulicéia, editora já extinta e que deixou grandes livros no sebo. Clássico é clássico e vice-versa, como diria o Jardel.

Crônica do amor louco – Charles Bukowski (L&PM). Poderia escolher qualquer outro do velho Buk. Fico com esta reunião de contos pela narrativa “A mulher mais linda da cidade”.

Paris é uma festa – Ernest Hemingway. Saiu por várias editoras. O barba que reinventou o daiquiri em Cuba completou o tanque nos cabarés franceses.

Rum: Diário de um Jornalista Bêbado – Hunter S. Thompson (L&PM). O gonzo e sua aventura no Caribe. O filme não é lá essas cocadas, mas o livro é garantido.

Manual de sobrevivência nos butiquins mais vagabundos–Moacyr Luz com ilustrações de Jaguar e contracapa de Martinho da Vila (Senac Rio). Tudo que você queria saber sobre boteco e tinha vergonha de parecer um bêbado amador.

Confesso que bebi – Jaguar (Record). Memórias de um amnésico alcoólico. Crônicas de um bebedor profissa.

A morte e a morte de Quincas Berro D’Água – Jorge Amado (Record e Companhia das Letras). Acho o melhor livro do baiano porreta. Espiritismo, álcool, metafísica e safadeza.

Malagueta, Perus e Bacanaço – João Antônio (Ática e Cosac Naify). Viagem ao fim da noite dos bares. Com tacadas de sinuca ao fundo.

Pornopopéia – Reinaldo Moraes (Objetiva). Só o caminho do excesso, com várias saideiras a cada esquina, conduz ao palácio da sabedoria.

Bíblia Sagrada – Duvido que exista um livro no mundo no qual se bebeu tanto vinho. In vino veritas. Nele está a verdade. Até água foi transformada na santa bebida. E olhe que neste tempo não tinha essa frescura de cheirar a rolha e sentir o bouquet. Era tudo macho-jurubeba de Cafarnaum e arredores.

Óbvio que ficou faltando uma prateleira de bons livros com cheiro de álcool. E olhe que não molhei ainda a palavra hoje. Hora do amigo fazer justiça ai nos comentários.

Ih, de cara, já senti falta de um dos livros que mais gosto: “De Moscovo a Petuchki – a lucidez de um alcoólico genial- Venedikt Erofeev (Cotovia, Lisboa).

Foi por causa desse cara que escrevi o meu “Tripa de cadela & outras fábulas bêbadas”(ed. Dulcinéia Catadora, 2007). Não vem ao caso. Quero saber mesmo é o que há de bom e ficou de fora.

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Tipos de canalhas: o aético e o romântico

Por xicosa
08/11/12 16:33

Eu sou uma pessoa má, eu menti pra você. É o que canta agora, rua da Aurora, Recife, minha cotovia Karina Buhr.

No que Jakson do Pandeiro emenda: Que diferença da mulher o homem tem? Espere ai que vou dizer, meu bem.

Tratemos do pecado da mentira, essa obviedade mais velha que a palavra e a saliva.

Porque deste pecado ninguém escapa. É o mais ecumênico e democrático. Por pensamentos, obras e omissões. Somos amorosamente corruptos, repito um velho mantra do blog.

Com os meios virtuais, meu glorioso São Tomé, ai é que a mentira alonga suas pernas de centopeia mesmo. Para dar conta da sua nova cara, teria que ser revisto e ampliado o mandamento específico das tábuas sagradas.

Mas que diferença da mulher o homem tem? Como em quase tudo na vida, as fêmeas são mais sofisticadas, labirínticas, possuem a arte da burla e das ilusões mais afiladas.

O macho abusa amadoristicamente, como se fosse um recurso tão natural quanto a água e o óleo de peroba.

Até os melhores exemplares da raça masculina cometem as suas trapaças, dissimulações, subterfúgios, maquiagens na face da quase sempre insuportável realidade. Do presidente da corte superiora ao trombadinha.

A diferença é que uns ainda coram, enquanto outros nem se incomodam com as faces infestadas pelos cupins do moralismo.

Todo esse lero-lero para dizer que voltei a folhear, na espera do dentista, “101 mentiras que os homens contam -e por que elas acreditam” (ed. Ediouro), da norte-americana Dory Hollander, um clássico da psicologia vagabunda.

Aliás, nem no dentista foi, o fato deu-se no consultório do homeopata, quer dizer, no psiquiatra…

Minto. Comprei mesmo o livro no sebo, por dever de ofício, e o devorei feito traça. Que mentira que lorota boa, seu intelectual de meia tigela, seu Zelig, que fica inventando desculpa para as leituras mais banais.

Dane-se, comprei, li e gostei, pronto. Melhor assim. E quer saber, é um clássico da boa picaretagem. Dona Hollander fez uma pesquisa séria, ouvindo muita gente, sobre nossas mentiras, nem sempre sinceras, e nossas piores promessas.

Vai de um inocente “estou cansado demais” a um irresponsável “eu te amo” -dito na hora errada à mulher errada, no lugar errado. Começo, meio e fim e a nossa cuca ruim, como na canção do príncipe Ronnie Von regravada pelo Otto.

Por que elas acreditam, então? A psicóloga arrisca respostas: as mulheres acham que ceticismo e romantismo não podem andar juntos, sob pena de estragar as coisas.

Dona Hollander nos separa em dois blocos:

1) os perigosos e, digamos, aéticos, que abusam da mentira, que enganam por “esporte e lucro”, de forma inescrupulosa;

2) os mentirosos ocasionais, que se mostram dissimulados sob pressão e desviam a realidade com pequenas lorotas, artifícios para se livrar da “fúria feminina”, digamos assim.

Na segunda categoria estão aqueles que poderíamos chamar de canalhas líricos, galanteadores como o personagem Bertrand, do filme “O homem que amava as mulheres”, de Truffaut.

De que lado você samba, meu amigo?

Dublês de d. Juans, os Bertrands apenas enfeitam, douram a realidade nas suas peregrinações em busca das crias das suas costelas.

E você aí, amiga, qual a pior mentira que já ouvi de um homem?

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Amor e sexo na voz de uma mulher

Por xicosa
07/11/12 10:00

Nada mais reconfortante do que ouvir a voz de Iris Lettieri (na foto) antes de embarcar no Antonio Carlos Jobim, o Galeão. Aquele aveludado, com tons de grave nada cinza, nos leva aos céus antes mesmo de qualquer partida.

Agora só é possível ouvi-la no internacional do Rio. Já esteve em outros no passado, como em Foz do Iguaçu, Manaus, Congonhas etc.

Na vastidão do Galeão a voz nos pega no colo, sussurra ao miocárdio, mostra que uma fêmea, muitas vezes, sequer precisa de um corpo.

Repito velha tese: mulher é metonímia, parte pelo todo. Basta um narizinho aqui, uma omoplata acolá, e está ganha a vida. Não carece ser bonita por completa. Melhor que não seja.

Voltando a ouvir atentamente La Lettieri, incluo a voz como parte dessa história. Com uma bela voz dentro do seu chatô, pouco importa que corpo tenha. Você só necessita daqueles fonemas noturnos ou matinais. Você vive de sussurros como um passarinho de alpiste.

A carioca dona da voz mais bonita do Brasil -Simone, de Olinda, com quem estudei, talvez seja páreo- foi a primeira mulher a apresentar um telejornal no país, na TV Globo, anos 1970. Depois foi para a TV Manchete, foi modelo, cantora, uma deusa.

Homens do mundo inteiro querem fazer amor com a voz de Iris. O Faith No More, por exemplo, incluiu, sem permissão, a gravação de sua voz na faixa “Crack Hitler”, do disco Angel Dust, de 1992. Deu um rolo danado. Achei uma bela homenagem.

Ao partir agora para o Recife, via Galeão, fechei os olhos, me senti em um quarto escuro, fazia amor com aquela voz. Para fazer amor com uma voz não é preciso o gemido de gozo mais explícito de Brigitte Bardot em “Je t’aime moi non plus”.

Na voz de Iris, basta um Air France, voo 447, Rio/Paris… Basta um Gol, voo 1150, do Rio de Janeiro para o Recife… Nem carece que estejas indo para os braços da(o) amada(o). A viagem de negócios mais chata do mundo se torna um veraneio em Bora-Bora.

É sim possível fazer amor com uma voz. Viajo feliz. Como se nas asas da Panair e do desejo.

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A doença infantil do machismo

Por xicosa
05/11/12 20:48

Como indagaria o amigo Marcelo Rubens Paiva: “E aí, comeu?”

E haja lenda.

O negócio é contar vantagem.

Daí, sabemos: uma das coisas mais hilárias, para não dizer infantis, dos modos de macho e os seus be-a-bás, é o caso do falso don Juan.

O homem, o mito, a fraude. Narrativas eróticas que jamais aconteceram à vera, apenas e tão-somente na garganta, riacho de muitos peixes grandes, do contador de vantagens.

A nossa mania começa logo nos verdes anos, na mentira de que não somos mais donzelos, e daí levamos ao túmulo, incorrigíveis e tarados Brás Cubas.

No princípio, é uma vergonha assumir a virgindade no meio de tantos machões que nos desfiam suas epopeias com o mulherio.

Aí contamos também a nossa “vasta experiência”. Não somos nada bocós ou bestas. Afinal de contas não podemos ficar para trás nesta gincana, neste infindável faroeste.

Segue a vida enfim, segue a vida, como decifra o velho Fred 04 no seu mundo livre sociedade anônima.

Um amigo relata no botequim que traçou uma flor do bairro ou a gostosa da firma; ouve o coro ridículo carregado de chope, caldinho, torresmo e testosterona à milanesa: “Comi muiiito!”

O cavalheiro silencioso, que não se pronuncia, por cerimônia ou ética, também é suspeito: se cala também é por ter comido muiiiito.

O falso don Juan é a doença infantil e incurável do machismo.
Todo homem, assim como todo pescador que se preza, tem sempre uma aventura maior que a vara.

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A dor de um breve e intenso romance

Por xicosa
04/11/12 01:39

Do jeito que o homem anda cada vez mais MacunaEmo, preguiçoso como o herói sem caráter de Mário de Andrade e chorão qual um sensível roqueiro moderninho, o jeito, minha amiga, é rir da própria desgraça.

Sim, é tempo de homens frouxos. A coisa vai além do simples sintoma da nossa época, a questão do amor líquido e sem firmeza. É pior do que se imagina.
As gavetas de Miss Corações Solitários, a conselheira amorosa do blog, estão abarrotadas de tal queixa. Que verguenza macharada!

Em uma das melhores cartas do gênero recebidas nesta semana, a leitora de SP sabe rir, e como!, da sua pequena tragédia:

Cara madame Corações solitários,

Te escrevo porque sofro a dor de um breve e intenso romance.

Veja só, querida, eu, sangue árabe, me apaixonei por um judeu lindamente neurótico. Daqueles de colocar Woody Allen no chinelo em sua hipocondria e paranóias.

Eis que nosso romance estava a mil maravilhas, viagens, cervejas e noites calientes de amor (com certeza serviríamos de exemplo aos nossos “primos” no que há de melhor do make love not war).

Acontece que ele veio com a velha ladainha típica do homem de ossanha: o problema sou eu e não você, gosto de você mas não consigo me relacionar agora e aplicou-me um belo de um pé na bunda no estilo israelita: bombástico.

Estou na maior fossa, me ajude madame, como sobreviver a este desfecho dramático de uma guerra que dura mais de 5 mil anos?

Espero sua ajuda,
Com amor, Sherazade.

Resposta:Estimada S., não há missão diplomática da ONU que dê jeito no vacilo masculino dos dias que correm. É mais fácil resolver a questão palestina.

Esse cessar fogo do dublê de Woody, depois de momentos tão calientes, é apenas a repetição da repetição do que vamos todos os dias por ai.

O macho moderno, em matéria de relacionamento, anda como aquelas promoções de magazines: só até sábado. Se muito.

Como te conheci pessoalmente, asseguro: ele desperdiçou de decifrar –ah quanta preguiça dos homens!-, os mistérios e segredos destes olhos árabes pelas próximas mil e uma noites.

Há riquezas em ti que valem por todos os potes de ouro das lendas do Oriente. Cariño, suerte, da tua M.C.S.

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