Folha de S.Paulo

Um jornal a serviço do Brasil

  • Assine a Folha
  • Atendimento
  • Versão Impressa
Seções
  • Opinião
  • Política
  • Mundo
  • Economia
  • Cotidiano
  • Esporte
  • Cultura
  • F5
  • Classificados
Últimas notícias
Busca
Publicidade

Xico Sá

Modos de macho, modinhas de fêmea & outros chabadabadás

Perfil Xico Sá é escritor, jornalista e colunista da Folha

Perfil completo

Sem imperfeição não há tesão

Por xicosa
08/10/13 16:06

Retomo as loas e homenagens a Vinícius de Moraes, cujo centenário é motivo de festa neste mês, com a reciclagem de uma crônica que dialoga com o poema “Receita de mulher”.

A mulher tem que ter uma barriguinha, nem que seja mínima, mas que haja uma hipótese de barriguinha.

Que haja uma hipótese de barriguinha, repito o poeta, depois de alertado por uma passional vinissólaga paulistana.

Que haja uma hipótese de barriguinha.

Essa é do mais safado dos nossos mulherólogos, na sua receita de beleza feminina.

Naquele mesmo poema em que ele pede desculpas às muito feias –devia ter bebido pouco naquele dia.

No mesmo poema que diz da beleza fundamental brota esse belo paradoxo para os padrões atuais.

Que haja uma hipótese de barriguinha. Nesse verso acertou em cheio. Depois de nove casamentos, o cara era um safo, o homem que sabia demais.

É preciso que haja, pelo menos, uma hipótese de barriguinha. Decorei, jovens. Palmas, poeta.

Aquela secura de tudo, além de fora da realidade anatômica, não é apreciável.

Chega de tábua. Isso é coisa boa apenas na passarela, como mulher-cabide para os estilistas.

Que haja aquela dobrinha quando a mulher se senta. A realíssima dobrinha da fêmea. Espetáculo.

E que não fique apenas na hipótese. Que haja uma barriguinha mesmo.

Pelas mulheres reais. Sem lipo, mas com muito desejo e outras aspirações.

Todo o segredo está na capacidade de variadas safadezas. Nunca no tamanho ou no peso.

Sem imperfeição não há tesão, que me perdoem as certinhas da praça.

E fica o mantra, pela milésima vez, à guisa de educação sentimental aos moços, pobres moços: homem que é homem não sabe, nem procura saber, a diferença entre estria e celulite.

Mais opções
  • Google+
  • Facebook
  • Copiar url
  • Imprimir
  • RSS
  • Maior | Menor

Senhor, livrai-me das tentações, mas não hoje

Por xicosa
06/10/13 00:04

Recordo a casa com varanda, minha mãe lá dentro dela… O Roberto mais freudiano, faixa “O divã” na vitrola.

Cantei muito esta, indagorinha, na companhia dos amigos bons de São Luís, lá na madruga do Chico Discos,  um bar-sebo, preciosidades na bagaceira das prateleiras e mulheres com o feitiço da misteriosa serpente que vive sob as pedras históricas da lenda-mor da Ilha.

Meu corpo cansado e eu mais velho/ Meu sorriso sem graça chorou/ Ah, como eu amei! Agora já estamos com o Benito de Paula, gênio do piano, pianinho, pois viver é maciota, só o vento sabe a resposta, já dizia um best-seller das antigas.

Viver eu sei lá que diabo é isso. Viver é um frege, um frevo em New Orleans, Bitches Brew, de Miles Davis, pela Orquestra Contemporânea de Olinda. É só um risco no disco, meu amor proibido em 78 rotações por minuto.

Agora mudando de pau para cacete. Hoje é meu aniversário, por isso que estou com esse papo aranha sobre o tempo. Hoje é aquele dia em que um amigo sacana repete a secular piada sobre a busca das pregas perdidas.

No natalício, viro homem do mato, me escondo, peço penico a um Deus possível, tiro onda relembrando as lições que aprendi ao ler e reler “Resoluções – Quando Eu me Tornar Velho”, o extraordinário manual de Jonathan Swift, o mesmo sábio das “Viagens de Gulliver.”

O irlandês, que viveu exageradamente para os padrões da época (1667-1745), nos deixou um receituário  que pode nos ajudar a envelhecer da melhor forma. Se é que é possível envelhecer com decência. Prefiro não.

Logo de cara, o autor, adverte sobre as lolitas: “Não casar-me com uma mulher jovem”. Deus é colágeno, ele envergonhadamente admite.

Corra, tiozinho, corra! Mesmo sabendo que mulher nova, bonita e carinhosa faz o homem gemer sem sentir dor. Mesmo sabendo, como diz o mesmo cancioneiro, que “pra cavalo velho o remédio é capim novo”.

Fundamental: “Não ser rabugento ou taciturno, ou desconfiado.” Se tem uma coisa que chama e que apressa a velha fatal da foice é a tal da rabugem.

Agora o mais grave e mais difícil para um homem envelhecido em barris de carvalho: “Não contar a mesma história de novo e de novo às mesmas pessoas.” E este é justamente o maior pecado deste cronista repetitivo.

É, contar a mesma história, com empolgação de quem conta uma novidade, é um dos maiores sinais que a velhice chegou. Seja qual for a sua faixa etária.

O tempo passando e eu mais velho. Como eu amei!

Uma imagem a zerar, como me receita o amigo Paulo César Peréio.

E neste balaio de gatos e citações, vale ainda e sempre o eterno mantra para envelhecer sem decência alguma, caros librianos: “Senhor, livrai-me das tentações, mas não hoje” (Santo Agostinho).

Mais opções
  • Google+
  • Facebook
  • Copiar url
  • Imprimir
  • RSS
  • Maior | Menor

O fim do 69 como prática sexual

Por xicosa
03/10/13 18:40

Ou o 69 como sexo vintage!

Como já dizia Malba Tahan, o homem que calculava, o 69 é a matemática da fome mútua.

Na tabuada do amor e do sexo, o 69 é par, jamais ímpar, a bela vida de ponta-cabeça.

Cabe a este velho cronista de costumes, na falta de pronunciamento da crônica fofa brasileira, denunciar o fim, digo, quase o fim, da prática do meia nove –esta originalíssima posição que faz parte da educação sentimental do brasileiro.

Óbvio que os tarados roots, os perversos de raiz, seguem o jogo erótico das antigas. O 69, porém, é cada vez mais raro como procedimento clássico de alcova, meu caro amigo Bataille.

Ouvi muitos chegados e fontes insuspeitas sobre o assunto. O Databotequim também confirma a tese.

O 69, para quem nem mais recorda o kama sutra básico, consiste no sexo oral simultâneo: ele n´ela, ela n´ele, tudo ao mesmo tempo agora.

As novas gerações simplesmente ignoram tal ambição de linguagem.

A falta de sexo oral, aliás, independentemente do tipo ou posição, é queixa generalizada do mulherio. [Vide “Pedagogia da manga”, aqui neste outro post].

Aprecio, mas nunca fui um fã número 1 do 69.

Sempre preferi fazer a minha parte, de forma devota e esmerada, e, em caso de merecimento –sexo oral é merecimento- receber a parte que me cabe no banquete homérico.

Franciscano, sempre acreditei mais no é dando que se recebe do que na oração simultânea.

Fico triste, porém, que o 69 esteja obsoleto, esquecido. Triste como cronista de costumes, melancólico na condição de homem.

Datou. É prática dos anos 70, 80, já era, soa a trombeta do apocalipse.

Apreciemos ou não o 69, tal geometria do desejo não pode cair assim em desuso.

Esquece. O 69 está fora de moda, a trombeta bíblica soa outra vez.

É o que também falam alto pelos botecos.

A voz rouca das ruas e dos céus das bocas idem, idem.

Pobre 69.

Tenho dúvidas, digo, quero provocá-los: procede tal extinção do clássico, da posição mais praticada nos motéis até os anos 1980?

Juro que deu vontade de ressuscitá-la com minha deusa.

Ressuscitá-la calmamente, dizendo vem cá meu bem, essas delicadezas perdidas.

Urge resgatar a tal extinta prática.

Há sempre algo bonito em uma esquecida prateleira do museu do sexo.

O silêncio do sexo oral simultâneo. O sexo cinema mudo.

Nada a dizer e tudo sendo bendito.

Amor que carece de explicação e legenda não merece tal nome. Viva o amor calado ou apenas gemido.

Por derradeiro, divido a interrogação do susto: o 69 está quase extinto mesmo ou é exagero da cronista?

Mais opções
  • Google+
  • Facebook
  • Copiar url
  • Imprimir
  • RSS
  • Maior | Menor

O medo do homem diante do varal

Por xicosa
30/09/13 19:28

Sophia Loren e Marcello Mastroianni: “Um dia inesquecível”

Ela deixa uma calcinha na casa dele, o macho moderno já assusta.

Ela deixa duas calcinhas, epa, o medo do cara diante do varal só aumenta.

Ela deixa um biquíni, afina de contas ela é carioca e quer ir à praia a qualquer momento que estiver na casa dele.

Ela deixa um shorts jeans, destes atuais, com os bolsos por fora.

Epa!

O macho moderno, que foge do vínculo como um beduíno sem rumo no deserto, começa a ficar assustado,  bota aquele olho do desespero, fica ensaiando para dizer algo para a moça, uma advertência etc.

Mais uma calcinha, agora no chuveiro, cada pingo um suspense na cabeça do sujeito.

Sem coragem para dizer nada, ele põe aquela tromba entediada, para começo de história.

Um colar, dois colares, brincos espalhados pela casa, joias e bijuterias … Tudo que reluz é susto para o rapaz.

Ele, estranhamente, vai se afastando da gazela.  Começa a sabotagem.

Tenho um amigo, também do time dos assustados,  que estabeleceu um critério: “Passou da meia dúzia de peças de roupa eu devolvo”.

Como se as seis inocentes calcinhas significassem casamento.

Bobagem, meu filho.

Às vezes ela deixa por praticidade, como o biquíni acima citado, por exemplo. Ela deixa por se tratar de uma moça relax, a leveza do ser em pessoa.

O medo do macho moderno diante do varal ou do cabide.

Bobeira.

Nada mais bonito do que aquela primeira calcinha pingando ainda um difuso sentimento no chão do banheiro.

O varal, aos poucos, como se fosse a primavera, florindo com as calcinhas dela.

Como me disse outro dia o Manuel, meu porteiro de Copacabana, “como é feio e triste um varal só de cuecas”.

De mudança, eu subia distraído com um varal recém comprado.

Manuel completou: “O varal já tem, seu Xico, agora só falta a mulher”.

O sábio porteiro ainda me acompanhou no elevador, com mais uma pérola:

“Compre umas calcinhas e pendure no varal, pelo menos para se iludir que tem uma mulher”.

Uma onda esse paraibano morador de Duque de Caxias.

Profissional, ele sabe como a presença da mulher é capaz de injetar vida no inóspito ambiente com o cheiro do queijo da solidão e da solteirice absoluta.

Uma calcinha, duas calcinhas, três calcinhas… Deixa a moça enfeitar sem medo a árvore da vida.

Mais opções
  • Google+
  • Facebook
  • Copiar url
  • Imprimir
  • RSS
  • Maior | Menor

Como destruir o amante da sua mulher

Por xicosa
27/09/13 03:15

 

Para você, leitor, que me pergunta sobre a continuidade dos dramas reais aqui narrados, dou conta resumidamente, com a ajuda do José Posadas (ilustração), o mexicano que sabia que amar é uma dança de esqueletos:

A D.R. do tipo anjo exterminador –a discussão de relacionamento que não acaba nunca- prossegue. A vizinha descobriu novas sujeiras do cara. Pelo menos deu cartão vermelho, ainda provisório, e o desalmado está em Teresópolis. Só escuto agora a fala dela, interminável, mas ao telefone.

Noêmia, a mulher que foi da descrença no amor aos braços do cafa, leu atentamente os comentários e conselhos do blog. Está mais calma. Tomou a água com sal marinho e açúcar à moda Paulinho da Viola –“não sou eu quem me navega, quem me navega é o mar”- e parou de susto. Te juega.

Brava Noêmia. Prometeu ir pela seta do proveito, está relaxada, jurou por Cosme & Damião, até tirou onda trocadilhesca de boteco:  infinito enquanto duuuro. Essas coisas, meu velho libriano, paudurescente e centenário Vinícius.

O problema é que apareceu outra alma penada. Agora um homem. Nada cafa. Um sofredor mesmo. Como o drama era igualzinho a do Amaro, lembra do Amaro? E como meu conselho ao Amaro foi, surpreendentemente, um dos mais bem-sucedidos da minha vida de cronista do amor e da sorte, só me resta repetir ao Demetrius, o moço que me procurou ontem no “Pavão Azul”, aqui em Copacabana, a mesma receita.

Caríssimo Demetrius, é só trocar o seu nome pelo do nosso sofrido Amaro. Amaro conseguiu, depois da lição abaixo, uma nova lua de mel, com a mesma pessoa amada. Repare:

O leitor aflito me escreve. Quer ajuda, conselhos, alguma consolação, ombro, ouvidos… Invoco a Miss Corações Solitários que costuma fazer morada nesta pobre caveira envelhecida em barris de bálsamo.

Não posso deixá-lo a mascar o jiló do abandono. Está desconsolado, como o Sizenando de Rubem Braga, que viu a amada cair nos braços de um playboy. Um idiota que não sabia sequer uma palavra de esperanto.

A vida é triste, Sizenando, como soprou-lhe o cronista.

Com Amaro não foi diferente.

Quis o destino parafusar objetos pontiagudos à testa da pobre criatura.

Sim, ela tem um amante. Pobre amaro. Daqueles amantes que se encontram à tarde, num intervalo qualquer, no recreio da vida chata.

Nem foi preciso contratar o detive particular, conta-me o nosso Amaro. Ele mesmo fez as vezes de cão farejador da própria desgraça.

Que fazer?, indaga, num email no qual até a arroba bóia em poças de lágrimas.

Mato o desgraçado?

Tiro a vida da desalmada?

Salto mortal da ponte Buarque de Macedo?, perguntou o recifense.

Um trágico, esse rapaz. Como os de antigamente. Amaro é do tempo em que os homens coravam. Ainda tenho vergonha na cara, diz, urrando vaidades e orgulhos.

Sossega, Amaro.

O melhor que fazes, respondi ao marido em fúria, é sumir por uns dias, inventar uma viagem, e dar todo tempo do mundo ao infeliz desse amante.

Banalizar o amante, meu caro e bom Amaro.

Entendeste?

Deixar que eles durmam e acordem juntos por vários dias seguidos. Que tenham seus problemas, que percam o luxo dos encontros fortuitos e vespertinos, que se esbaldem.

É necessário deixar a Bovary sentir o bafo de onça matinal da rotina.

A vida dos amantes dura porque eles só vivem as surpresas e valorizam cada minuto do relógio que põem sobre a cabeceira.

Nada mais cruel para o amante da tua mulher que presenteá-lo com o pão-com-manteiga do dia-a-dia. A rotina é o cavalo de tróia do amor.

Amaro, nada de violência ou besteiras desse naipe.

Ao amante, todas as chances do mundo. Ao amante aquela D.R., a famosa discussão de relação, em plena TPM.

Um amante nunca sabe o que venha ser uma mulher sob o domínio da TPM. Ela faz questão de reservar todos os direitos desse ciclo ao pobre marido.

Ao amante, Amaro, a tapioca fria e sem recheio da rotina do calendário.

Ao amante, Amaro, a falta de assunto.

Ao amante, os cabelos revoltos da mulher, naqueles dias em que nem mesmo ela se agüenta ou encara o espelho. Naqueles dias em que os cabelos brigam com as leis do cosmo e não há pente ou diabo que dê jeito.

Some, Amaro, depois me conta.

Repita a receita, caro Demetrius, a gente se encontra no balcões solitários de Copacabana.

Mais opções
  • Google+
  • Facebook
  • Copiar url
  • Imprimir
  • RSS
  • Maior | Menor

Quando se ama um cafajeste (I)

Por xicosa
26/09/13 03:17

Escaldada, Noêmia, 36, separada havia três anos, tentava fugir do amor de qualquer jeito. Sem acordo, benzinho, ela dizia aos pretendentes. Objetiva, queria apenas sexo e diversão. Faíscas de ironia nos olhos, era capaz de apagar as velas daquele jantar no bistrô-caô, para desilusão dos moços que tentavam romantizar a noite.

“Fique tranquilo, meu rapaz, te levo pra cama, não faça drama, mas, por favor, sem esses truques. Sou uma mulher que já viveu tudo e não vai cair de novo no traiçoeiro alçapão dos periquitos grudentos”, ela mandava na lata, sem piedade.

Era tão objetiva que só marcava encontros pontuais, como os encontros por intermédio do aplicativo Tinder. “Por que preliminares se podemos ir direto aos finalmentes? O meio é a mensagem”, tirava onda a maluca. Chegava a ser cruel com esses moços, pobres moços.

Como não existe uma só criatura à prova do feitiço amoroso, Noêmia caiu no conto, como ela define. De novo. Conheceu um cara na festa de casamento da irmã mais nova, Gláucia, 29, moça de ideais mais antigos, digamos assim, graciosa habitante de Niterói, Rio de Janeiro.

Niterói, como até o último misógino do ocidente sabe, é a cidade com as mulheres mais bonitas do universo. Já fizeram pesquisas e tudo. Comprovado. É científico.

Mas isso não vem ao caso agora.

O certo é que no casamento da caçula, Noêmia foi fisgada por um cafajeste, como ela me conta agora na sua carta: “E você, caro cronista, ainda fica dizendo que os cafajestes legítimos estão em extinção, qual o quê, balela!”

Irremediavelmente apaixonada, ela pede ajuda, um SOS para a barca que a conduz aos braços do homem que a tortura. Jamais imaginara tal situação, por mais que o amor seja primo-irmão do susto e da surpresa.

No último domingo, possuída e dominada pelo carinho público do sujeito, em uma galeteria do bairro da Glória, “onde mora o desgraçado”, inventou uma desculpa, a morte de um parente, e foi embora.

“Não resisto aos bons modos desse fdp”, ela relata. “As feministas estão certas, o cavalheirismo é uma forma de dominação sim, estou com as radicais”.

O cara é do tipo que puxa cadeira, abre portas, reserva o lado de dentro da calçada para a mulher, faz questão de pagar a conta e só não vai deixá-la em casa porque prefere que ela durma com ele. Na feira da Glória, aos domingos, água de coco para curar a ressaca e flores.

Inconsolável, ela teima:

“Ele tem tudo do cafajeste clássico, o cafajeste de cinema, aquela coisa meio Peréio meio Jece Valadão (na foto lá em cima com Norma Benguell)”.

Assustada, aos céus blasfema:

“Que mundo é esse, meu Deus, que o contrário do homem frouxo vem a ser um obsoleto cafa à moda antiga?”

Ela tem certeza. Ele deve fazer essa corte com várias. Noêmia viaja em perdidos pensamentos na barca. Esse homem não existe, apareceu como encomenda para me deixar confusa. Ela imagina.

Noêmia grita o SOS. Outro dia, ao telefone, ele falava baixinho, como não quisesse acordar outra amante, Noêmia delira. Embarco nas viagens de Noêmia. Antes o meu Tinder sem riscos, ela maldiz a noite que o conheceu pegando a batata palha do jantar do casamento.

Apocalíptica de véspera, N. está crente que vai quebrar a cara. FRAUDE AMOROSA NA GLÓRIA!!!, ela antecipa a manchete em seis colunas.

Ele tem a pausa dramática dos melhores cafajestes. “Pior: ele me ouve”, prossegue. “Ele sabe acariciar a veia que salta no meu pescoço, meu fraco, ele não me toca pela metade, ele sabe me beijar como em uma lição de anatomia completa”.

O pior ainda, para a orgulhosa Noêmia, é que ela deixou escapar um escandaloso “eu te amo”na última noite que estiveram juntos. “Que amadorismo”, lamenta. “Logo eu… Sorte é que ele bebe, tomara que não tenha ouvido”.

Noêmia pede ajuda. Difícil aconselhá-la assim de bate-pronto. Recorro aos meus generosos leitores e leitoras pra gente tentar entender o que se passa com a amiga da barca do inferno –assim ela define a difícil travessia à Gil Vicente.

Como deve agir a desconfiada senhorita?

Mais opções
  • Google+
  • Facebook
  • Copiar url
  • Imprimir
  • RSS
  • Maior | Menor

Se o homem amasse mulher como ama futebol

Por xicosa
23/09/13 00:52

Amor fora de campo: Garrincha & Elza Soares.Foto:EPA

O que aconteceria se o homem, aqui vale o homem normal, a média dos homens -aquele cara simples, tarado por mulher, cerveja e futebol – gostasse tanto da sua amada como gosta do seu time do peito?

Seria uma revolução. Mudaria tudo. Tudo mesmo. Repare:

Para começar, o macho jamais deixaria a sua fêmea. Nunca, never. Homem que é homem muda de sexo mas não muda de time.

Mesmo quando ela se sentisse a pior das criaturas, por baixo mesmo, mesmo quando ela blasfemasse aos céus e se queixasse ao espelho que estava gorda e autoestima despencara.

Muito pelo contrário. Isso seria motivo para aumentar ainda mais o amor e até para renovar a paixão, com garantia eterna de fidelidade, como ocorre quando o time do homem cai para a Segundona do campeonato –“Eu nunca vou te abandonar, Corinthians”.

Se o homem gostasse da mulher pelo menos 50% como ama o seu time, nem uma bola nas costas, uma traição, como uma derrota incompreensível, seria motivo para o fim do relacionamento. No futebol, assim como no amor, tudo seria perdoável.

Se o macho normal gostasse da cria da sua costela como quem aprecia um Flu, um Fla,um São Paulo, um Peixe, um Palmeiras, um Bahia, um Santa Cruz, um Galo, um Grêmio, arranjaria tempo para ir com ela ao cinema ou jantar fora pelo menos duas vezes por semana –no mínimo empataria com o tempo que dedica ao clube.

Apreciasse sua mulher como é chegado ao futebol, o sujeito trocaria pelo menos uma mesa-redonda na tv por um conversa com a dama. Em vez da crise no Vasco, tentaria entender a derrota que virou seu casamento.

Se o Cruzeiro anda tão bem, brilha na dianteira do firmamento, por que não melhorar também, amigo,  a posição na tabela no jogo dentro e casa? Deixar tudo mais celeste, o amor azulzinho em um céu de brigadeiro?

Não sejamos exagerados. Bastaria dedicar 30% do que se devota ao time do peito. Teríamos uma mudança radical na vida dos casais.

Imagina se o torcedor do Goiás, caro Rogério Bueno, cantasse assim para aa namorada, como canta para o time esmeraldino: “Pra vencer tem que ser guerreiro/ Pra te ver sou sempre o primeiro…”

O cara é capaz de morrer por um triunfo do Furacão, do Coxa ou do Sport, o cara chora pelo Botafogo, o cara come toda a água do planeta pelo Vitória, o timbu deixa o lar doce lar para ir sofrer em São Lourenço da Mata…

Se o homem gostasse tanto da sua mulher como gosta do seu clube o domingo seria outro. Quando o time fosse derrotado, ele se confortaria no amor e no sexo da princesa. Não é o que acontece. A desgraça no futebol o inviabiliza na cama. É batata.

No caso da mulher doente por futebol, mesmo uma corintiana, creio que a relação seja outra. Na alegria ou na tristeza clubística, ela é a mesma. Consegue separar o desejo com o amado do placar domingueiro.

Como diria meu amigo Nick Hornby, não há termômetro que entenda o macho e essa febre de bola.

Mais opções
  • Google+
  • Facebook
  • Copiar url
  • Imprimir
  • RSS
  • Maior | Menor

A D.R. tipo ´Anjo Exterminador´, amor

Por xicosa
20/09/13 02:58

Pela minha lesada contagem, lá se vão três noites de D.R., a sigla da mitológica e inevitável Discussão de Relação.

O casal aqui de lado de casa. Acontece.

Como é triste, como é doloroso, mas o casal, em aparente fim de feira, pitangas na bacia das lágrimas, está numa espécie de “Anjo Exterminador” da lavagem de roupa suja.

“Anjo Exterminador” (foto), como até Neide, minha querida faxineira da Paraíba/Duque de Caxias sabe, é aquele filme de Buñuel. Pânico ao champanhe: todo mundo preso em um jantar da aristocracia, ninguém consegue sair do palacete.

Igual ao casal aqui ao lado.

O casal que mora ao lado extermina o amor, como o anjo que paira sobre o filme burguês que botei na roda.

Casal lindo e maluco.

Vou e volto da rua e escuto a expressiva fala da mulher e o silêncio do homem. No máximo ele contesta as acusações ampliando a música –gosta de rock clássico, mas nunca pôs Lou Reed. No máximo ele bota bem forte o chuveiro ou dá um murro na porta.

A mesma porta que cabe a um dos dois bater por último. Tudo faz sentido, meu Lacanzin querido.

Ele silêncio, ela chora nesse exato momento sem dó nem piedade. As mulheres não são covardes, elas não guardam o apocalipse no peito, mulheres são rios de uma aldeia de Tolstói, dois olhos chorando pelo mundo todo.

Agora a escuto, ela toma fôlego para dizer umas verdades, a ira reverbera em Copacabana como tempestade de lágrima em um teto de zinco.

Ela rasga as verdades, ela repete, ouvi nos últimos três dias, os nomes das mulheres envolvidas no enredo das traições.

Repete, dramatizando a voz do canalha, as mensagens do marido para as supostas biscaites de Facebook. Quinta dos infernos.

Ele bufa. Pela leitura que faço do silêncio ou do não-diálogo, acha que chegou a hora de acabar mesmo. Não tem é coragem, como a maioria dos homens. Penso que está louco por isso. Só espalha a merda e espera subir o “the end” nos créditos.

Ela discorre. Pede que ele zele pela família que tanto acreditou na história dos dois. Às vezes ela apela para o que foi construído etc. Quatro anos juntos entre namoro e quarto-e-sala em Copa. A família é da serra, Petrópolis.

Às vezes, ela chuta o balde: seu canalha fdp, fiz tanto por você, e é assim que você me paga? Parece que ela segura muito a barra de grana. Ela o humilha nesse aspecto e é capaz de lembrar que bancou até a roupa do casamento.

Ela volta a repetir as mensagens dele com as outras no maldito Facebook. Um dia, como sempre acontece, alguém pega o computa do outro aberto. Essa encenação das mensagens é o que há de mais dramático.

Ela capricha nos requintes de imitar a fala do cafa flertando com as “cadelas”. No que a vizinha fala cadelas o sotaque carioca grita, fica mais lindo e trágico, como no “Vestido de Noiva” do tio Nelson.

O pior: entre as vagabas, uma amiga dela, pelo que escuto. Uma amiga dela, mas ainda na fase dos acertos, o cara não foi às vias de fato (ainda), pelo que dizem aqui os cobogós que vazam a D.R. Estiveram apenas juntos no Pavão Azul, uns chopes, uns drinques,talvez uns beijos -uma amiga mandou uma foto que carece de tira-teima.

“Você beijou aquela puta na boca?”, agora ela pergunta.

Silêncio dos inocentes.

Quarto gol do Atlético Paranaense sobre o Flamengo. Agora ele está puto. Soca a parede. Pelo Mengo ou pela intriga com a nega?

A D.R. e o vazamento dos cobogós.

Uma pausa, este blog é cultura arquitetônica: você sabia que a palavra cobogó vem das iniciais dos sobrenomes de três engenheiros que trabalharam no Recife no começo do século passado? Co de Coimbra, Bo de  Boeckmann e Go de de Góis.

Sinto que ela ou ele escorre o macarrão. Barulho do saca-rolha. Vinho. Ela continua com a adorável lavanderia a todo vapor: “Mal beijei aquele cara e você não aguentou um segundo, agora você faz essa merda toda e fica fingindo que nada aconteceu, porra!?”

Exasperados, eles comem.

“Você não comprou parmesão? Não tem nem queijo ralado?”, ela volta a culpá-lo.

Como é triste, como é doloroso.

“Poxa, tudo menos minhas amigas”, ela fala na primeira garfada, agora tudo muito lento e vagoroso, beberam, brigaram, gastaram…

Ela esmurra o cobogó, mas também sem muita força. Ao contrário da porta, o cobogó é amor ventilado, não prende ninguém por acaso.

Opa. Agora ensaiam um sexo. Sabemos que os embates também levam a isso.

Sinto muito, o sexo não deu certo. Era muita mágoa. Mas pelo menos eles dormiram.

Como é triste o fim das histórias.

Vilge, voltaram a ser gladiadores de novo, a gente que já passou por tantos fins de amores sofre mais uma vez ao ouvir o telecatch pombalíneo.

Como dói cada objeto quebrado dentro de casa. Que triste. Agora um jarro sobre a parede. Será que ainda com flores?

Ah, se nem Deus é por nós, nessa tragédia amorosa, quem dirãoos cobogós?

Mais opções
  • Google+
  • Facebook
  • Copiar url
  • Imprimir
  • RSS
  • Maior | Menor

Todo desespero por amor e sexo é legítimo

Por xicosa
19/09/13 03:17

“Vícios não são crimes”, me bate aqui, na cabeçorra nordestina, o belo título do livro de direito que mais aprecio no mundo, o de um cara chamado Lysander Spooner, escrito ali na segunda metade do século XIX. Um gênio abolicionista, anarquista e jusnaturalista da América do Norte.

Se vícios não são crimes, imagine, minha linda, os desejos, os sentimentos.

Todo desespero por amor é comovente.

Todo desespero por sexo igualmente -o desespero, na maioria das vezes, sequer sabe onde começa um e prossegue o outro.

Repare no episódio desta moça de Belo Horizonte que pendurou faixa na rua e tudo para reencontrar um parceiro de uma sala do bate-papo do UOL. Repare direitinho na foto de Carlos Eduardo Cherem.

O apelido do cara na rede: Bonito.

Deve se achar a última costelinha do estoque do restaurante dona Lucinha, deve se achar o último torresmo da cozinha mineira, a última cachaça de Januária, o último pote de doce de leite de Viçosa.

Não vem ao caso. É fantasia. Está valendo. Deixa o menino brincar como queira.

Muitos amigos viram a história como golpe de marketing da moça, seja que utilidade tenha essa exposição no reino da Carençolândia explícita. Outros simplesmente ignoraram até agora a notícia: têm coisas mais graves para se preocupar, como os embargos infringentes do STF, a “crise” do Corinthians ou a dianteira do Cruzeiro.

Algumas amigas leram com a lente óbvia e azulada do clichê: falta de homem no mercado. Tenho as minhas dúvidas. Da Mooca por diante não falta homem, para ficarmos na geografia paulistana.

Melhor pensar como uma deusa de Poços de Caldas que conheci no “Sempre um Papo”, caro Afonso. Ela simplesmente fez a Kátia, a ceguinha amiga do Rei, e sussurrou ao telefone: “Não está sendo fácil…”

Diante da faixa desesperada da moça do bairro de Santo Antônio, BH, matutei, capinzinho metafísico entre os dentes, sobre encontros & desencontros, os flertes sinceros, mesmo os fugazes, mesmo os virtuais ou aquelas silenciosas e realíssimas trocas de olhares na noite.

Em tempos “mudernos”, criaram até sites, como o Segunda Chance, dedicados a procurar essas criaturas passantes que, por loucura, desespero ou bela fantasia de ficcionista, julgamos como os amores das nossas vidas. Nem que seja por cinco minutos.

Com ou sem as geringonças tecnológicas ou a fácil e automática busca no Facebook, o mundo sempre foi assim. Em Minas ou no Texas, meu velho Carlos Albertos Prates Correia.

O Bertrand, por exemplo, “O  Homem que Amava as Mulheres” do filme do  Truffaut, viu apenas as lindas pernas de uma mademoiselle que entrava apressada em um carro.

O conquistador só teve tempo de anotar a placa do veículo em um maço de Gitanes. Lembro o número até hoje porque ganhei no jogo do bicho um dia depois que fui ao cinema do Parque, no Recife: 6720 RD 34. Joguei a milhar inicial. Cachorro na cabeça, mas só acertei a dezena.

Só sei que Bertrand acabou batendo no carro da moça, de propósito, em um estacionamento. Seria a única forma de reencontrá-la, mesmo que por intermédio de um processo. Deu azar. A proprietária era outra francesa, uma prima. Não teve dúvida: ficou apaixonado por ela também, o que custa?.

E assim, comovidos, seguimos. E assim, desesperados(as) ou não, gastamos nosso calendário na terra. O bom é ter sempre um suspensezinho amoroso ou sexual para aliviar o trabalho e os dias.

Mais opções
  • Google+
  • Facebook
  • Copiar url
  • Imprimir
  • RSS
  • Maior | Menor

Entre a dor de cabeça e o orgasmo fingido

Por xicosa
17/09/13 14:29

Diante de cartas e mais cartas de leitores, baixou de novo uma Miss Corações Solitários neste escriba que vos sopra o cangote. Miss C.S., entidade que herdei do amigo Nathanael West,  socorre machos & fêmeas à beira de um ataque de nervos… ou simplesmente portadores do inapagável (sic) fogo nas entranhas, como na dolorosa novela que ilustra este post. Às cartinhas, pois, aqui histericamente resumidas:

Querida Miss C.S., o fingimento do orgasmo também pode ser uma prova de amor? (Sonsa de Mimoso, PE)

Resposta: Estimada consulente, é preferível a dramaturgia do gozo àquela velha dor de cabeça que te abate justamente na hora em que ele te procura. Isso é que é falsidade imperdoável. O orgasmo fingido é perdoável. Há um quê de distanciamento brechtiano no orgasmo fingido. O prazer fingido engrandece o homem, além de ser mais verossímil do que aquele espetáculo verdadeiro e exagerado, cheio de caras, bocas e nove-horas. Sim, é prova de amor e caridade cristã. Prossiga. Cariño, M.C.S.

Gloriosa Miss C.S., o cachorro que arrumei é um borracho, um papudinho, um come-água, bebe sempre demais e não funciona quando mais careço. Que fazer? (Vampira de Curitiba)

Resposta: Muita calma nessa hora, criatura. Trata-se do famoso tipo homem-tupperware, aquele que você guarda para comer no dia seguinte. É só saber usar o traste e pronto. Sorte, M.C.S.

Bem-aventurada Miss C.S., ele não me procura mais, o que fazer? (Desvalida da Serra do Rola-Moça, Minas)

Resposta – Pobre alma em desassossego, nada de apelar para cursos de strip, promoção de lingerie ou aquelas mil e uma novas posições complicadas que você leu na revista “Nova”. Uma amiga minha, por exemplo, tentou uma daquelas posições inovadoras e acabou com o marido num hospital de fraturas -e de madrugada, o que é pior. Só te resta, pobre alma, seguir o conselho do mago Paulo Coelho: senta-te à margem do Rio Piedra e chora. Tuas lágrimas irrigarão teu caminho e da terra brotarão novos caules. E tem mais: larga esse infeliz que não serve nem mesmo para abrir potinhos de pepino em conserva. Coragem, tua M.C.S.

Poderosa Miss C.S., fui vergonhosamente traído por minha mulher, tipo flagrante delito, o que fazer? (Devoto da Gaia Ciência, Piraporinha, SP)

Resposta: Amigo inconformado, deixo aqui, à guisa de filosofia consoladora, a sabedoria de um parachoque que acaba de me abalroar: “Chifre foi feito pra homem, boi usa de enxerido”.  Sem mais, M.C.S.

Escreva você também para Miss C.S.

Mais opções
  • Google+
  • Facebook
  • Copiar url
  • Imprimir
  • RSS
  • Maior | Menor
Posts anteriores
Posts seguintes
Publicidade
Publicidade
  • RSSAssinar o Feed do blog
  • Emailxicosa@uol.com.br
  • FacebookFacebook
  • Twitter@xicosa

Buscar

Busca

Blogs da Folha

  • Recent posts Xico Sá
  1. 1

    O partido dos corações partidos

  2. 2

    A arte da cantada permanente

  3. 3

    O tal do amor aberto dá certo?

  4. 4

    E Abelardo da Hora recriou a mulher

  5. 5

    Como eleição mexe com amor e sexo

SEE PREVIOUS POSTS

Arquivo

  • ARQUIVO DE 20/03/2011 a 11/02/2012

Sites relacionados

  • UOL - O melhor conteúdo
  • BOL - E-mail grátis
Publicidade
Publicidade
Publicidade
  • Folha de S.Paulo
    • Folha de S.Paulo
    • Opinião
    • Assine a Folha
    • Atendimento
    • Versão Impressa
    • Política
    • Mundo
    • Economia
    • Painel do Leitor
    • Cotidiano
    • Esporte
    • Ciência
    • Saúde
    • Cultura
    • Tec
    • F5
    • + Seções
    • Especiais
    • TV Folha
    • Classificados
    • Redes Sociais
Acesso o aplicativo para tablets e smartphones

Copyright Folha de S.Paulo. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress (pesquisa@folhapress.com.br).