Pela minha lesada contagem, lá se vão três noites de D.R., a sigla da mitológica e inevitável Discussão de Relação.
O casal aqui de lado de casa. Acontece.
Como é triste, como é doloroso, mas o casal, em aparente fim de feira, pitangas na bacia das lágrimas, está numa espécie de “Anjo Exterminador” da lavagem de roupa suja.
“Anjo Exterminador” (foto), como até Neide, minha querida faxineira da Paraíba/Duque de Caxias sabe, é aquele filme de Buñuel. Pânico ao champanhe: todo mundo preso em um jantar da aristocracia, ninguém consegue sair do palacete.
Igual ao casal aqui ao lado.
O casal que mora ao lado extermina o amor, como o anjo que paira sobre o filme burguês que botei na roda.
Casal lindo e maluco.
Vou e volto da rua e escuto a expressiva fala da mulher e o silêncio do homem. No máximo ele contesta as acusações ampliando a música –gosta de rock clássico, mas nunca pôs Lou Reed. No máximo ele bota bem forte o chuveiro ou dá um murro na porta.
A mesma porta que cabe a um dos dois bater por último. Tudo faz sentido, meu Lacanzin querido.
Ele silêncio, ela chora nesse exato momento sem dó nem piedade. As mulheres não são covardes, elas não guardam o apocalipse no peito, mulheres são rios de uma aldeia de Tolstói, dois olhos chorando pelo mundo todo.
Agora a escuto, ela toma fôlego para dizer umas verdades, a ira reverbera em Copacabana como tempestade de lágrima em um teto de zinco.
Ela rasga as verdades, ela repete, ouvi nos últimos três dias, os nomes das mulheres envolvidas no enredo das traições.
Repete, dramatizando a voz do canalha, as mensagens do marido para as supostas biscaites de Facebook. Quinta dos infernos.
Ele bufa. Pela leitura que faço do silêncio ou do não-diálogo, acha que chegou a hora de acabar mesmo. Não tem é coragem, como a maioria dos homens. Penso que está louco por isso. Só espalha a merda e espera subir o “the end” nos créditos.
Ela discorre. Pede que ele zele pela família que tanto acreditou na história dos dois. Às vezes ela apela para o que foi construído etc. Quatro anos juntos entre namoro e quarto-e-sala em Copa. A família é da serra, Petrópolis.
Às vezes, ela chuta o balde: seu canalha fdp, fiz tanto por você, e é assim que você me paga? Parece que ela segura muito a barra de grana. Ela o humilha nesse aspecto e é capaz de lembrar que bancou até a roupa do casamento.
Ela volta a repetir as mensagens dele com as outras no maldito Facebook. Um dia, como sempre acontece, alguém pega o computa do outro aberto. Essa encenação das mensagens é o que há de mais dramático.
Ela capricha nos requintes de imitar a fala do cafa flertando com as “cadelas”. No que a vizinha fala cadelas o sotaque carioca grita, fica mais lindo e trágico, como no “Vestido de Noiva” do tio Nelson.
O pior: entre as vagabas, uma amiga dela, pelo que escuto. Uma amiga dela, mas ainda na fase dos acertos, o cara não foi às vias de fato (ainda), pelo que dizem aqui os cobogós que vazam a D.R. Estiveram apenas juntos no Pavão Azul, uns chopes, uns drinques,talvez uns beijos -uma amiga mandou uma foto que carece de tira-teima.
“Você beijou aquela puta na boca?”, agora ela pergunta.
Silêncio dos inocentes.
Quarto gol do Atlético Paranaense sobre o Flamengo. Agora ele está puto. Soca a parede. Pelo Mengo ou pela intriga com a nega?
A D.R. e o vazamento dos cobogós.
Uma pausa, este blog é cultura arquitetônica: você sabia que a palavra cobogó vem das iniciais dos sobrenomes de três engenheiros que trabalharam no Recife no começo do século passado? Co de Coimbra, Bo de Boeckmann e Go de de Góis.
Sinto que ela ou ele escorre o macarrão. Barulho do saca-rolha. Vinho. Ela continua com a adorável lavanderia a todo vapor: “Mal beijei aquele cara e você não aguentou um segundo, agora você faz essa merda toda e fica fingindo que nada aconteceu, porra!?”
Exasperados, eles comem.
“Você não comprou parmesão? Não tem nem queijo ralado?”, ela volta a culpá-lo.
Como é triste, como é doloroso.
“Poxa, tudo menos minhas amigas”, ela fala na primeira garfada, agora tudo muito lento e vagoroso, beberam, brigaram, gastaram…
Ela esmurra o cobogó, mas também sem muita força. Ao contrário da porta, o cobogó é amor ventilado, não prende ninguém por acaso.
Opa. Agora ensaiam um sexo. Sabemos que os embates também levam a isso.
Sinto muito, o sexo não deu certo. Era muita mágoa. Mas pelo menos eles dormiram.
Como é triste o fim das histórias.
Vilge, voltaram a ser gladiadores de novo, a gente que já passou por tantos fins de amores sofre mais uma vez ao ouvir o telecatch pombalíneo.
Como dói cada objeto quebrado dentro de casa. Que triste. Agora um jarro sobre a parede. Será que ainda com flores?
Ah, se nem Deus é por nós, nessa tragédia amorosa, quem dirãoos cobogós?