Amar é tirar uma sesta imoral e imodesta
22/06/14 06:41Minha ideia de amor é a mesma ideia de uma bela sesta ou siesta.
Depois daquele almoço gostoso ou do almoço possível, seja com requinte ou aquele mexidinho do free-jazz mineiro com as sobras completas, como o arroz-de-puta, as sobras de todas as geladeiras, seja como for, uma refeição decente, uma delicadeza quentinha para o estambo, estômago, haja conforto, não há pobreza em minha alma que resista ao air-bag da plenitude gástrica –dessas coisas elaboradas que um matuto do Crato aprende com a sabedoria lacaniana.
Corta.
Minha ideia de amor e revolução é a ideia de nouvelle vague de siesta. Aquela refeição, um barulho da metrópole ou uma elipse da mesma dita cuja, uma tarde na Várzea, Recife, Pernambuco, só nos dois e as obras completas jiboiando sem necessidade de citações ou rodapés para as teses da UFPE, pronto.
Minha ideia de amor é…
O que fizemos de nós dois analfabetos completos de nosotros?
Amor é Mobral.
Amor é nunca saber nada, naenderthal.
Corta para sinais primitivos nas grutas de nós dois.
Só a siesta salva a ignorância amorosa.
Siesta é mãe, viagem amorosa, fragmentos do discurso amoroso, rapay.
Na capacidade de dormir 30 minutos depois das refeições está a ideia de cinema, de sonhar como em um filme de Buñuel, o único cara que interessa a essa altura.
Buñuel é cinema de siesta, compay, todo mundo sabe mas nem todo mundo diz.
A mesma ideia de suspeitas masturbações sem imagens óbvias. Amar é inventar um enredo mínimo para as próximas acontecências na cama.
Minha ideia de siesta, e tirar uma siesta é mais revolucionário que o mais menino dos black blocks, é a ideia de uma siesta que mate o capitalismo pelo menos meia hora por dia, ora ora.
Engana-se quem acha que combate o capitalismo com o mesmo enfrentamento burro dele –AH O TRABALHO IDIOTA!!!
Todo trabalho é alienação em estado bruto.
Só o sonho vago, que não serve sequer para uma sessão de análise, mata o capital do nosso juízo.
Só o sonho vago da prole, o jogo do bicho como morte de Freud, como sonhar e jogar no cachorro na dezena 17, ora porra, independentemente dos falso enevoados.
Não há revolução no trabalho. Engana-se. Além de levar as bordoadas de quem é pago pelo Estado e pelo Capital pra bater sem dó nem piedade.
Só a vagabundagem das intermináveis siestas embute a contradição do capital babaca.
A revolução é não se entregar ao trabalho, ou você acha que tem diferença de ser escravo da imprensa burguesa ou da imprensa independente, mesmo morrendo de fome? Quem vai pagar a conta?
Mudando de assunto sem mudar de tema. Quando um black bloc quebra uma vitrine de luxo está apenas comungando do mesmo fetiche burguês. O papai também ama aquele Hyundai, se é que você me entende na psicanálise mais rastejante do meu mundo tatu-peba.
No que vos digo, como naquela velha crônica paleolítica:
Como é bom tirar uma sesta, abaixar a cortina e dar um risinho safado para o capital que se esborracha lá fora; como é bom, mesmo para um falido, ajeitar os travesseiros –de palha ou de pena de ganso- e cerrar os olhos para sonhos pequenos.
Uma sesta à sombra da toda-poderosa Federação das Indústrias do Estado de São Paulo, a Fiesp, aqui perto do meu esconderijo; uma sesta com as janelas abertas na rua da Aurora, a rua mais linda do mundo, de onde avista-se Beberibes, Capibaribes, Áfricas, Tongas e Polinésias…
A minha sesta ibérica, como na origem do costume, lá no Juazeiro e Crato. Como é bom tirar uma sesta com uma nega enroscada aos pés, sono leve de conchinha, colherzinha e quetais. Mas os dois precisam estar no espírito da sesta. Uma alma em desassosego acaba com qualquer sesta, sesta-de-favor não vale, sesta, siesta, carece de savoir faire… Um gato ali pelas nossas costelas –opa!, um felino de carne e osso, um bichano- que delícia.
Numa sesta não vale sonhos épicos, apenas sonhos pequenos, daqueles que a gente realiza num piscar de olhos. Ou simplesmente deixa para lá. Ridículo correr desembestadamente atrás de sonhos. Sonhos são filmes grátis, que vemos deitadinhos, sem o barulho ridículo de pipoca ou de gente.
“Ei, morena linda que passa, vamos ao cinema?” Ai trago ela para a sesta. Cinema é travesseiro e pezinho colado.
Os sonhos são feitos pelos cineastas mortos, jeito de ocupar-lhes no purgatório. Coisa da aliança espúria de Deus e do Diabo.
Sesta: modo de usar. Quanto dura uma sesta? O ideal é que não se faça o uso do despertador, que não seja um curta-metragem, que seja um filme que se durma nele inteirinho, que se beije o olho de quem dormir primeiro, como sempre guardo as minhas mulheres, até com uma rezinha baixinho para nunca acorda-las e sempre protege-las, ô Deus guarde essa costela colada à minha e que esse suorzinho seja o superbonder possível, a resina mais grudenta, que nos livre do fim, amém. Mas o amor acaba, meu filho, sopra um anjo pousado no ombro de Paulo Mendes Campos, que me diz baixinho, sossega, menino, esse coração.
A sesta com a bênção das mulheres e da minha mãe. “Meu filho, durma pelo menos uma meia horinha depois do almoço”. Minha mãe chorava, no dia em que fui embora, mas nada dizia além da receita da sesta. Mulher de coragem: deixar aquele graveto, só o couro e o osso, ganhar a estrada apenas com uma rede que ela botou no fundo da mala…
Como eu queria achar de novo essa rede e tirar a maior das sestas, mas troquei por alguma coisa, vício, comida, sei lá, entre uns desalmados de um cortiço do Recife, num sótão ali na Barão de São Borja. Até quando a usei, era uma rede que balançava lágrimas e meus chinelos sempre acordavam boiando de manhã.
Xico Divo do meu coração!
Como não melhorar o dia depois de te ler? Faz sentido a vida depois de ler suas crônicas, como se organizasse todas as minhas ideias sobre vários assuntos numa tacada só.
É alimento pr’alma!
Xico,não consigo por vezes amarrar seus parágrafos,te acho fenomenal,mas por vezes apenas mais um bossal(com 2 esses )mesmo assim ,aprecio ler seus textos,parece que o boçal sou eu.
mandei bossal com dois ss? avimaria. so sendo um porre de copa. vou corrigir. gracias por avisar.abraço e volte sempre a casa é nuestra
Xico Sá
Suas crônicas sempre me emocionam. Me transportam para uma época que nunca vivi e no entanto tenho uma saudade que doi.
ESSE É XICO DE QUEM ESCUTO FALAR AQUI EM CRATO. NASCIDO EM CRATO, CRIADO EM SANTANA DO CARIRI E, DEPOIS, GANHOU O ÔCO DO MUNDO!
te amo, xico sá.
Gostei do texto. Irônico, leve, gostoso. E o autor tem razão. Viva a sesta depois do almoço e tds os nossos dribles no capitalismo.
Grande Xicórea!
Hoje foi um texto de emocionar!
Valeu, obrigado!
Obrigado pelo sorriso que provoca e pela leveza que provoca na gente toda vez que lemos seus textos.
Um dia, com a “Nega Fulô” da coragem em minhas mãos, vou lhe apertar a mão e lhe dar um abraço lá na Mercearia!
Grande, grande abraço!
Você pode dizer que eu sou um sonhador
mas eu não sou o único
espero que um dia você se junte a nós
e o mundo será um só
IMAGINE-John Lennon.
Meu coração fica feliz ao ver gente de todo mundo ,de credos,culturas e raças diferentes , se confraternizando com alegria e paz durante estes dias de Copa.E ainda subestimam a força do futebol.Pena que seja só por um mês, quando deveria ser pra sempre.