Carta ao Raskólnikov brasileiro
13/02/14 05:42Meu caro menino Caio Silva de Souza, antes de qualquer choro, mais que digno, um abraço forte, por tudo, e aqui me compadeço, sinceramente, por saber que tua tristeza, de certa forma, é também a minha angústia ao melhor modo Graciliano Ramos, para quem não sabe o maior escritor russo de todos os tempos, só ele te entenderia nessa maldita hora.
Só quem vem de lá saca essa coisa dos nordestinos como os melhores escritores russos do planeta: Clarice Lispector, por exemplo, aos dois meses era uma recifense completa. Só nasceu na Ucrania. Deixa quieto.
Que merda, caro Caio, mais triste que teu olho exposto, sob os urubus televisivos da montanha dos sete abutres, foi a versão sobre suas pausas e silêncios. Ninguém respeita.
Quem pode dizer o que pensa um olho sem estar no branco ou no vermelho dele?
Tô puto pelo Santiago, um cara que conheci em meus 30 anos de jornalismo.
Ele se foi, o cara que sabia filmar o mundo, mas quem morreu de fato foste tu diante de todas as câmeras, meu velho Raskólnikov.
Grande Raskólnikov, acompanhei as tuas horas antes da chegada da Polícia lá no hotel da Bahia… Torcia, sinceramente, pela tua fuga para o Ceará, chega de mentira nessa hora. O pior estava feito.
Torcia por saber o proveito que tirariam e mais ainda por conhecer a polícia… Qual um apanhador no campo de centeio achavas que irias ser morto.
Acho que corres muito esse risco agora no presídio. Sinto te falar dessas coisas…
Óbvio que serias o troféu de toda uma gente, a grande redescoberta para salvar o Cabral, argh!, etc, foste produto desse povo.
Que tal cobrar por direto de imagem na campanha eleitoral, meu jovem?
Òbvio que matar é o mesmo que morrer em matéria de culpa e seguir vivo. És o novo Raskólnikov, o personagem de Crime & Castigo do gênio Dostoievski, menino.
Os heróis e os fodidos se igualam no Brasil ou na Rússia, isonomia da narrativa, nessa hora: Caio e Santiago são os mesmos para as minhas sinceras lágrimas. Choro pelos dois.
Choro, me apiedo, não culpo.
Um não queria matar, outro, menos ainda, ser morto.
Como o jovem da pensão e a velha do romance russo acima citado.
Imprudências juvenis à parte, todo dia nego mete o cano na nuca de zilhoes e está lá o corpo estendido no chão, que bosta.
Que merda.
A dor da gente não sai no jornal. Só sai quando interessa ideologicamente. Posso estar exagerando… Sempre amo o contraditório.
Caio, falo do rapaz acusado de acender o rojão, ainda bem que você tem uma mulher que te ama, que bela namorada, sempre perto, isso é que é mulher, porra. Imagina você sozinho de tudo nessa hora!
O amor é sempre inimputável. E o inferno talvez seja mais cruel para quem ficou vivo.
Quem ama defende apesar de tudo. Todo homem, até você ai, metido a civilizadíssimo.
Que merda, né, te diria, em uma missa de corpo presente, menino Caio, sem julgamento, até pediria a tua última cerveja, todo homem, seja quem for, merece, beberíamos e lamentaríamos juntos, chorando, certamente, a morte do velho Santiago.
Só um louco ou a ideia corrente da mídia conclui que saíste de casa para matar uma pessoa naquele dia.
Não importa a razão que saíste de casa naquele fatídico evento. Importa é que deu merda e por isso a doideira dessa história.
Todo dia nego mata zilhões de não-jornalistas na perifa. Longe de mim cobrar que também, velho e amado Santiago, isso seja notícia de pelo menos 2 minutos no “Jornal Nacional”.
Jamais veremos isso na tela. Pelo que te conheci, Santiago, tu farias belas imagens sobre qualquer assunto, embora tenha te visto muito reclamando que nego não editava a vida como ela é etc.
Receberia as piores notícias, amada Patrícia Poeta, dos teus lindos lábios.
Solte este marginal que o povo fará justiça,
já que a nossa justiça é muito complacente.
Será que foi ele mesmo? Mas para os apedrejadores tem uma Madalena ou um Judas para culpar.
Precisely why no company is writing about watch and for this reason the things you should create right now.
Caro Xico, que bom saber que nao sou a unica a me compodecer. Belissimo texto. te curto de montao no Saia Justa. Abraço.
Matar ou morrer, quem verdadeiramente morre? Quem mata ou quem morre?… afirmação esta que sempre causa indignação aos Hominais, digamos comuns. Adorei seu texto! Que bom que vc existe, também o JB,
que saudade do JB!!
Curto mais o Saia Justa com vcs do que com elas!!
Que bom caro Xico saber que nao sou a unica a se compadecer. Belissimo texto!!
Te curto de montao no Saia Justa. Abraço.
É Xico! É a vida editada como ela é!!
Entendo o linchamento midiático e o “boi de piranha”, mas acender e apontar rojão pra outro profissional (o policial) pai de família, cumprindo ordens, tb não está correto e assume-se o risco de causar um mal maior a alguém.
Genial Xico, como sempre. Dá gosto ler seus textos. Você destoou da turba enfurecida (e da mídia vingativa) e foi capaz de fazer o maus dificil: enxergar o óbvio. Enxergar e narrar os fatos. É claro que ele não queria matar ninguém… é claro que deu merda. Infelizmente o cara morreu porque o menino acendeu o rojão. Ele será punido por isso, o Direito Penal prevê essa conduta (homicídio culposo). Mas, como você bem disse, os abutres querem mais… (você poderia citar o Meursault, do Albert Camus… Mas acho que Crime e Castigo caiu bem melhor, você tem toda a razão). Abraços, meu velho!!!
Desculpa, Xico. Entendo você querer ver o outro lado e culpar a mídia por dar ênfase apenas àquilo que “vende mais”. Com certeza a morte de um jornalista/cinegrafista dá muito mais ibope que de um moleque qualquer que vive na periferia.
O problema está na falta de causa/consequência neste país. Se não esinarmos a TODOS que tudo que fizermos há uma consequência nossa sociedade nunca irá avançar.
Se você suborna um policial com 50 reais para livrar a multa de velocidade, você está abrindo prescedente para que ele receba 1500 reais para olhar para o outro lado na boca de fumo na esquina de sua casa. Se você ascende um rojão e solta em direção à multidão, não importa se há apenas policiais do outro lado, são ainda seres humanos, e há uma grande possibilidade de a consequência de seus atos ser a morte de uma pessoa.
Somos todos um pouco culpados e responsáveis por nossos atos. Um mais que os outros.
ótima reflexão, Daniela. viva o debate. beijo
Texto comovente!! Expressa o dúbio: o inocente X culpado, menino X elemento marginal. A mídia realmente achou uma vítima atroz, um culpado para a morte lamentável de um colega de profissão. E a morte de tantos pobres, miseráveis nas ruas? E os mendigos queimados vivos? E os homossexuais assassinados? Tudo no silêncio. Talvez a voz só pertença à mídia, a nós o silêncio. Não, não queria que a morte de Santiago ficasse em pune, sinto muito pelos seus familiares, mas sim queria que as outras mortes ecoassem tanto e clamassem tanta justiça quanto essa. Ah Caio, Viver é um negócio muito perigoso.
Xico voce deve ser parente da Maria do Rosário, e por azar o rapaz não é filho de um Eike Batista, então ele tá ferrado, e só falta eles encontrarem quem está pr trás e tudo virar Ptizza.
Lúcida reflexão, são muitos Severinos iguais em tudo e na vida….Caio é o novo boi de piranha, em homenagem ao seu texto, segue o poema:
A VIDA
A VIDA É AS VACAS
QUE VOCE PÔE NO RIO
PARA ATRAIR AS PIRANHAS
ENQUANTO A BOIADA PASSA
PAULO LEMINSK
a folha bate, mas assopra através do xico, pelo menos isso. poético e lúcido texto!
mas num é nada combinado não.beijos e volte sempre
Só falta falar igual ao Chaves(o do SBT) Foi sem querer querendo.
Na cadeia só tem inocente. Feriu a lei dos homens e lai de Deus. Aí não tem salvação.
Análise mais rasa que o pires da xícara do meu cafezinho hein Fernando ? Tbm, citar o Chaves mostra bem suas referências…
Como é bom ler isso, Chico! E você não está sozinho nessa. Muita gente (de vários walk of life) está discutindo essa triste espetacularização ideológica e conveniente. Apesar do massacre midiático.
é, matar agora é desculpável e defensável aqui na F/o/l/h/a por uma pessoa não muito melhor do que aquele que acende um rojão e mira na multidão…. vale, sim, matar… desde que seja por um bem maior… lamentável…
Respeito sua opinião e agradeço a leitura. O bom é isso: o debate e a discussão sem baixaria.abs
Obrigada, Xico. Lavou-me a alma!
beijo grande
Alma lavada, é o que sinto!
Muito bom o texto, xico, com um olhar que perpassa a ignorância nossa de cada dia, que só julga, sem pensar no fato de todos sermos humanos, alguns, mais ignorantes, acham que todos que erram devem morrer, ao que parece, acham que nunca erram. maravilhosa a forma de olhar para o garoto, sendo verdade tudo que a mídia comprada diz ou sendo tudo verdade, que seja somente uma farsa sua prisão, mas quem quer que tenha provocado, como dizia o jornalista da globo, bernardo Menezes, a policia pode ser a culpada, pela tragedia e alguns grupos acharam de por a culpa no garoto, como disse, indiferente quem seja o culpado, a dor, o desgraçar de uma vida, o ser humano, ainda merecem o olhar como ser humano.
Junto as dores um texto tão ímpar e que dialoga profundamente com tanto o que não se veicula pros meus pais, tios e vizinhos. Vontade de ler pra eles. Vou ler pra eles. Vontade de transformar este texto em cena. Vontade de agradecer por este texto. Obrigado!
Quando até mesmo o ato de matar outro se torna voz passiva no contexto político, é sinal que a corrupção já permeeou TODAS as camadas da sociedade….. Incrível ter de ler isso ao acordar, a relativização total de um homicídio, como se não houvesse o morto. E quanto à gente morrer na “perifa” (sic) , te garanto que é mais fácil morrer no Morumbi, saindo do trabalho com um ridículo terno (morando na periferia) do que propriamente habitando-a. Que inversão de valores, inclusive com a vida humana!
Xico, também lamento que a massa de manobra é infinitamente maior que os interessados a analisar e entender os fatos.
Enquanto a mídia servir apenas a si mesma, jogando confetes sobre a própria cabeça e conduzindo a imensa parcela de cordeiros cegos, não vejo alternativa para o Brasil e o seu povo ignorante em sua grande maioria. Você sabe mais que eu, Xico, mídia manda, política obedece. Lamentável.
Belo artigo.
O pior é que nem parece ser o tal Caio nas imagens…
Caro Xico, você pode dar à situação e à condição do rapaz toda essa estatura de fatalidade e de dilemas existenciais, que obviamente também existem, mas os fatos parecem mostrar que ele era uma peça, um ‘nem tão inocente’ útil, em engrenagens muito mais pragmáticas e ideológicas do que você quer acreditar. As próprias empresas para as quais você trabalha foram absolutamente condescendentes com a violência, e em outros momentos as usaram, quando isso interessava para mostrar o ‘desgoverno’ e a ‘falta de ação’ do executivo…
Nossa, que bom ler o que penso e não consigo expressar, assim, de maneira tão forte, lúcida e emocionada.
Valeu, Xico. Perfeita analogia.
Chico,
Se vc tem a liberdade de escrever tudo o que pensa eu também tenho.
Vc é um canalha.
Querido Xico, quem tem um advogado como aquele não precisa de inimigo. Obrigada por mais um texto que me traduz – tirando esse final com a Patricia Pateta que quase estraga tudo. 😛
Xico sá, sempre surpreendente. …
poderia termsido eu (não como fotógrafo) a levantar, acender e soltar o rojão, quantas vezes jã o fiz contra uma socio politica arbitraria, injusta…poderia ter sido eu a acender o rojão…comtra a vendalização de minha vida
Xico, lindissimo seu texto! Mas tudo tao revoltante, tudo tao inacabado….e agora Jose? A dificil “arte” de entender o inexplicavel…
Well done….take care meu caro Xico!