Como o diagnóstico psíquico interfere no amor etc
31/05/13 20:43Quase todo mundo hoje tem um diagnóstico, como um crachá pendurado no pescoço.
Além de simpático, neurótico, todo errado, como na bula do doctor Jorge Mautner, até este banal cronista já foi enquadrado no transtorno de déficit de atenção. Ritalina foi o barato.
Ainda bem que não botei muita fé. Tenho defeitos demais para acreditar apenas em um deficitizinho de gente lesada. Segui com o inevitável e necessário mal-estar no mundo, além do filtro azulado de Miss Melancolia, claro, minha inseparável companheira, principalmente aos domingos, óbvio.
Quem dera ser apenas um lesado devendo atenção ao movimento do universo. Muito poético para quem realmente carece de um recall divino da fábrica, embora dona Maria do Socorro tenha feito o melhor possível para o seu rebento.
Chega. Falemos de vocês. Só sei que todo mundo tem a sua síndrome. Quem não tem de verdade deseja uma a todo custo –em um mundo diagnosticadíssimo não ter uma etiqueta desse tipo é estar por fora.
Ter um diagnóstico é tão comum como dizer o signo em começo de namoro para ver se combina. Uma vez revelado o seu diagnóstico à pessoa amada, no entanto, aquele rótulo vai guiar, digo, influenciar a relação. Principalmente as discussões, as famigeradas D.Rs.
Basta você mudar de opinião, o que é mais que legítimo, para ouvir: só sendo bipolar mesmo! Diante de qualquer piração mínima e comum da existência: seu maníaco-depressivo de uma figa!
Os diagnósticos obrigatórios –ora, todo laboratório que se preze quer nos entupir de pílulas, eis o parque industrial, minha gente- viram uma escravidão amorosa sem fim. Melhor não revelá-los assim do nada no começo da história.
Não acha?
Às vezes o(a) pretendente até acha charmoso no primeiro momento, afinal de contas ninguém resiste ao grande festival de síndromes.
Cuidado.
Se você é do tipo que revela logo de cara, em busca de um certo desconto com a pessoa supostamente amada, recomendo que dê marcha à ré nessa atitude, apesar da tarja preta tingir de certezas todo o globo terrestre.
Todo cuidado é pouco. Tudo que era charme no primeiro momento pode virar um inferno. Tudo que era coincidência de diagnósticos e até receitas divididas pode virar um suplício.
E por ai seguem as ofensas científicas. No começo de relacionamento estas mesmas ofensas, diga-se, funcionam como álibis, licenças poéticas: Ah, tenho que entender a sua bipolaridade, ah, ele é neurótico, quase de guerra, que fofo etc…
E assim por diante.
Como não entendo nada de psicanálise, embora tenha decorado duas ou três frases do mal-estar da civilização do doutor Sigmund Freud, o que me chamou a atenção foi um barraco que testemunhei agorinha em um restaurante de Copacabana.
O estúpido atacava a bipolaridade da gazela. Como se buscasse razão para humilhar a mina no diagnóstico. O estúpido babava pelos cantos da boca e ainda se orgulhava de uma certa normalidade. O estúpido era tudo que ele era.
O mais normal dos estúpidos com sua cara de babaca.
Quando o diagnóstico vira arma de vingança dos idiotas. Era o caso. Fiquei puto.
Não tem feriado no sanatório geral da existência.