O amor e o transtorno do diagnóstico
02/08/12 00:54Ela me conta, na cama, logo depois da nossa primeira noite, que sofre do transtorno da bipolaridade.
Só quero ver, com mais detalhe, a cor dos seus olhos. Ela insiste em esmiuçar o diagnóstico.
-Aumenta, aumenta, é Strokes –ela diz.
Subo o volume da KCRWRadio que toca no ipad. –Cala a boca bem-te-vi –ela ri do pássaro colado na janela. (Impressionante como tem bem-te-vi em São Paulo.)
A música é “Machu Picchu”.
Ela fala dos tantos remédios que toma. Sente saudades da Ritalina, ri bonito. Ela conta muito sobre a vida, um casamento, a família interiorana, viagens, projetos, o significado de tantas tatuagens, diz que falo árabe dormindo.
Agora ela chora. Choro junto, havia um bocado de coisas represadas. As lágrimas das raparigas são coquetéis sem álcool, lembro da frase do gajo Miguel Esteves Cardoso, autor de “O amor é fodido”.
Cortinas abertas para o mundo. Ela vai embora qual uma Barbarella lindamente armada até os dentes. Ela vai embora e me deixa pensando em tudo.
Não me espanto em nada com o diagnóstico dela, embora eu tenha amigas, com este e outros humaníssimos transtornos, que me dizem: “Não conto esse tipo de coisa de cara, deixo bem mais para adiante. Tem homem que sai correndo”.
Como os diagnósticos são cada vez mais comuns e catalogáveis –todo mundo porta o seu debaixo do braço- quero dividir com vocês essa dúvida. Contar ou não contar, por exemplo, que é um(a) fóbico(a) medicado(a)?
Em que momento abrir o jogo? Você acha que atrapalha a possibilidade de romance?
Juro que tenho uma certa atração pelos diagnósticos. Dá vontade de cuidar, mesmo quando é algo bem leve. Uma vez que de perto ninguém é normal mesmo, por quê temê-las?.
Não pode é haver –e já vi um tanto disso- esse orgulho todo pelos diagnósticos mais pesados. Como se fossem álibis para quaisquer desgraças ou impossibilidades.
Enfim, vivemos uma era em que muita gente chega na vida do outro com um diagnóstico –em vez da loucura não medicada de todos e de sempre.
Há um momento certo para este tipo de papo? Quanto mais à queima roupa mais eu me comovo. Agora é com vocês: ajudem este velho cronista a entender os novos tempos.
Lembrei de um episodio do livro ” O amor nos tempos do Cólera ” , quando Florentino Ariza que pegava todas as mulheres enquanto esperava por Fermina Daza , arrumou uma criatura linda no Carnaval, brincaram e se esbaldaram os tres dias e no último ela é encontrada pela ambulancia do hospital psiquitarico de onde ela tinha fugido. Mas Florentino só estava mesmo esperando aoutra. e valeu o carnaval.
bela lembrança. tai um livro pra reler agora.bjo
Li o texto e os comentários e vi que as opiniões se dividem. Acho que não é legal contar logo de cara, mas também não pode demorar muito. Sinceramente não sei como lidaria com essa situação…
Sou sempre a favor da loucura não medicada (achei a expressão bem bonita!). O diagnóstico, metonimicamente, toma o lugar da pessoa e desresponsabiliza. Eu acho que cada um tem que se responsabilizar por si e pelos seus sintomas e que o mundo seria muito melhor se mais pessoas fizessem análise ao invés de tomar remédio.
E ser um pouco louco, surtado, faz bem demais! Não esqueço de um certo moço que me disse que eu fico uma gracinha surtada (e até que eu me acho bem normal), mas foi o elogio mais lindo que ele podia me fazer.
Contar logo de cara faz o outro sair correndo… é fato! Ninguém quer ter o peso de pensar que pode precisar cuidar de alguém… É Xico, suas deixas são boas pra gente pensar. Sou sua fã!
Engraçado que recentemente comentei com amigos sobre essa alegria em dizer. Tomo rivotril, tenho depressão, sou bi polar…..eh neh. Tah na moda!
Depende da natureza do encontro, se a mulher ou homem estão dispostos a se divertir, rir, fazer sexo por quê misturar transtornos, autopiedade, naquilo que deveria ser uma noite maravilhosa!!! todo mundo tem seu lado meio negro. depende do que se quer. uma noite de de deliciosa farra não significa um pedido pra compartilhar a vida. é melhor ir devagar e saber viver o momento e entender o que ele representa
Acho uma grande chatice essa ode aos remédios que controlam as nossas emoções, afinal são controlados! Dá vontade de dizer: babe, normal vc se sentir feliz e triste no mesmo dia, na mesma hora, somos hormônios, lembranças, expectativas e tals Ok, ok… há vários casos medicamentosos, well, nesses casos, não conta de cara, deixa a conversa fluir mais, um pouquinho mais de intimidade, vai que que nem rola um segundo encontro!
Revelar ou não, acredito que não seja a questão. O fato é que as pessoas estão com muito medo e receio de se relacionar e encontram em qualquer “problema” do outro uma saída por justa causa.
Fiquei pensando… será que já existem os fetiches por pessoas com diagnóstico psiquiátrico. Tenho um amigo cadeirante que já recebeu propostas de pessoas que têm tara por deficientes. Ele se diz caso raro. Tem pólio. Fico imaginando a pessoa no chat de bate papo – morenabipolarbundagrande -. Será que a moda pega?
Depois que uma garota de programa contou que o cara pagava a ela só para ele lamber a sola do seu salto alto, não duvido de mais nada.
é que vc nunca viu o quanto os caras pagam pra não ter nenhuma relação sexual, só pra serem humilhados…
Divertido!! morenabipolarbundagrande, rs!!! Acho que pode pegar sim…
Em um primeiro encontro? Não conta! Fico assombrada com pessoas que saem por aí contando tudo. Para que a pressa e o desespero em se revelar? Deixe o tempo fazer o seu trabalho, permita ao outro a descoberta, o diálogo…
“vivemos uma era em que muita gente chega na vida do outro com um diagnóstico –em vez da loucura não medicada de todos e de sempre”. É isso! Quem é “normal”? O que é ser “normal”?
Xico, já fui de falar na lata, sem muitos arrodeios e isso me rendeu fugas das mais vorazes. Agora, presto mais atenção a quem me relato. Creio que faria isso com você, que inspira confiança e sedução.Tb penso que neste dia a bipolaridade poderia estar do lado mais eufórico. Deve ter sido o encontro com você. bjs
“Lembre-se que de perto ninguém é normal e que a melhor companhia é só um cara legal”
Wander Wildner, o poeta gaudério, em “Milonga para um homem de poucos dentes”
Admirado e querido Xico!!
Creio que esta deve ser uma dúvida muito comum atualmente nas pessoas sensatas…
Comentando sua dúvida, penso que se fosse comigo, eu contaria, sim! Ainda mais, se fosse para alguém que realmente me interessasse. No entanto, eu não faria isso com qualquer um… Somente contaria sobre o meu “diagnóstico” para uma pessoa certa, num momento oportuno e da maneira correta! Eu tentaria resolver isso por passos…
Refiro “pessoa certa”, pois não são todas as pessoas que “merecem” saber de nossos “problemas”, de natureza íntima. Tem muita gente que devido a pouca instrução, preconceito e/ou incapacidade, só seria capaz de fazer julgamentos e comportar-se covardemente ao ouvir algum comentário desta ordem.
Digo “comportar-se covardemente”, pois acredito que uma das primeiras coisas que se passam pela cabeça dos “desinformados e preconceituosos” é de “sumirem”, para não terem que enfrentar o medo originário de suas próprias ignorâncias a respeito do assunto que lhes foi dito. Infelizmente, mesmo nos dias atuais, quando o assunto é de ordem emocional, ainda é tratado de forma preconceituosa.
Penso que devemos falar sobre o assunto no momento oportuno; creio que não seria apropriado já falar no 1º encontro, por ex, de que você tem uma “fobia medicada”… A meu ver, os primeiros encontros têm o direito de se apropriarem em mostrar o nosso lado mais apreciável, interessante e admirável! Depois, com o tempo, vamos mostrando o restante… (risos!). Um pouquinho mais tarde, quando o(a) “pretendente” já tiver conhecimento de algumas de nossas qualidades, será a hora certa… A notícia que talvez pudesse ser um “pouco bombástica” será como uma “biribinha” aos olhos “inebriados” do(a) pretendente… rsrsrs!
Contar da maneira correta… Ao contar, não supervalorize o “assunto” como se fosse a coisa mais importante de sua vida (mesmo que seja! Rsrsrsrs! Assim você não assusta quem não conhece o assunto direito). Conte tranquilamente, como algo que é comum e que costuma ocorrer na vida de muitas pessoas hoje em dia.
Em suma, acredito que você deva contar sobre o seu “diagnóstico” à pessoa contanto que ela tenha um mínimo de instrução (senão não valerá a pena, será somente perda de tempo e energia para você); também acho que você deva contar sobre o assunto somente após os primeiros encontros e de uma maneira em que a pessoa perceba que o “problema” que você abordou, trata-se de algo que é comum nos dias atuais e normalmente tratável…
Minha sugestão: procure resolver o problema com uma boa dose de equilíbrio e algumas pitadas de intuição… Penso que é desta forma que deveríamos resolver quase tudo na vida…
Caro Xico, gostaria muito de saber quais foram as conclusões que você chegou, após ler minha visão e as outras tantas escritas aqui.
Estou curiosa para saber sua resposta!!! Não deixe de escrever, hein?
Adoro ler suas crônicas!!!
Um beijão!!
Concordo, Noêmia. trouxeste uma reflexao interessante aqui pro debate.beijos
Sei não….”Bi-polaridade” sempre existiu,mas parece que hj em dia é quase moda dizer que se é bi-polar, parece até desculpa para ansiedade que se tem viver um não-sei-o-que que da na gente (principalmente domingos rs) Vou pensar aqui e depois eu te conto Xico. Ainda não se sou ou sou.Sou! não! Não sou! hahahaha um dia te falo Bjo ”velho” Xico rsrsrs (unico velho xico pra mim é rio São Francisco) hahahaha Tu é como digo cabra-da-peste! Tanto cabra, qto peste hehehe
De médico e louco todo mundo tem um pouco. Só que de louco, tenho mais do que os outros.
Não assusta so homens não. Tive um namorado durante longos 2 anos que ja se apresentou como bipolar. Na minha casa tem varios, achei que não seria o problema. ôxe! Foi um relacionamento extremamete penoso pra mim, e o pior, muito dificil de se livrar. Depois desta experiência, nem preciso de diagnostico na lata: se percebo os sintomas, ja saio correndo logo.
Esconda, divulgue, divirta-se… foda-se
Eu escondo. Na boa. Levei tanto tempo aprendendo a fazer a bem-comportada para agora sair confessando, assim de primeira? Ah, nem vem. Acho o máximo sair de sensata e só ir mostrando a doida em doses homeopáticas. Mas é questão de preferência. Cada um tem a sua.
Hoje em dia normal é ser doente… as pessoas brindam psicotrópicos… o mundo é uma psiquiatria a céu aberto… é só olhar na cara das pessoas…
Piadinha infame: ” Um louco olhou pra outro louco e disse: – Eu hein!
Tá doido!
Já achei que precisava falar de cara sobre meu diagnóstico (bipolar). Depois de ter me dado muito mal, perdido oportunidades por covardia masculina, hoje não falo. Sou medicada, estabilizada, pareço uma neurótica comum, normal, além de psicanalisada. Hoje quem escolhe sou eu. Covardes eu percebo de cara e corro.
Parodiando Cazuza, Posologia, “eu quero uma pra viver”…
Hoje em dia tem até diagnóstico para quem simplesmente deseja arduamente receber diagnóstico. Aquele papo antigo de “o doutor disse que é melhor não contrariar…” materializou-se. Claro que tem quem tenha mesmo transtornos sérios, mas, há quem se auto diagnostique, é cool ostentar um rótulo, ainda que seja de patologia…
Sei lá, não sou garrafa e não ganhei etiqueta colada nem carimbo na testa, mas, respondendo à pergunta, gosto da postura da tua “Barbarella” inspiradora. essa coisa de ficar escolhendo hora certa, isso não existe. Hora certa é serviço de empresa de telefona. É bom que seja logo de primeira, dá logo ao sujeito a oportunidade de correr se ele não segura o rojão. Assim quem não perde tempo é a suposta “transtornada”, que não tem coisa mais transtornante que gente frouxa.
Assustou com o nome na capa, não merece ler nem o prefácio. 😀
Também sou bipolar e também sinto saudades da Ritalina. Fui diagnosticada há dois anos, a experiência que vivi neste período me ensinou que a se preservar é essencial para a não banalização do que sento.
Prefiro deixar para falar sobre isso quando vejo que a pessoa ao meu lado, um affair, um amigo, pai ou mãe, vá sofrer as consequências de uma crise.
A bipolaridade esteve comigo desde que nasci, com ou sem diagnóstico, mas não resume o que sou.
Têm quem ache que o dignóstico sirva como desculpa para tudo aquilo que se é capaz ou não de fazer. E os remédios, muletas para a funcionalidade cotidiana. Então não se afirma como bipolar, e sim, se justifica como sendo bipolar.
Prefiro que qualquer pessoa me conheça por todas as outras coisas que sou, sem usar um diagnóstico para me analisar ou me desvendar.
“Prefiro que qualquer pessoa me conheça por todas as outras coisas que sou, sem usar um diagnóstico para me analisar ou me desvendar”.
Perfeito!
Corra, Lola… corra!
acho q eu não sei não
Quem quiser que chore!TENHO DITO!
Xico, meu rei, você é homem único, a quem, tenho a impressão se pode contar tudo, pois sabe apreciar as tensões de uma rapariga. Porém, como bipolar diagnosticada, te digo, na lata, é perigoso! Fiz muito isso de contar de cara, hoje não mais. Assusta e os homens estão tão despreparados, tão insensíveis! Engraçado atualmente estou saindo um professor que está afastado por ter adquirido neurose dos alunos. Me contou no primeiro dia. Eu gostei e o respeitei um pouco mais por isso. Não fugi, não me deu medo, mas ainda não tive coragem de contar sobre meus dois polos. No geral, assusta, mas acho que diagnosticados tendem a ser solidários, resta saber quem abre o jogo primeiro.
velho xico, hoje os tempos são pra se entrar de cabeça sim, mas o legal é extrair a diversão de tudo isso, sem se perder ou se culpar, o “aa queima roupa” depende do modo, afinal.
Belíssimo, Xico!
Esses diagnósticos tão ”certeiros” é que fazem a magia da descoberta esvair.
Nem tanto nem tão pouco. Acho que pra uma primeira saída há coisas que é melhor deixar só subentendidas. O que não pode é fazer como um ex-namorado meu, que só contou que curtia sadomasoquismo com um ano de namoro….